O fio da memória é tão delicado: se quebra a qualquer momento. É que a memória é um fio.
A memória é um fio: um sorriso, um riso, ou a cor dos olhos dele.
A memória é um fio que risco: vou de uma página à outra. Rabisco letras abertas, que são nomes de pessoas como a gente. Somos nós. Posso dizer seu nome aqui para você saber que é você? É de você que falo quando escrevo.
O fio da memória hoje passou por aqui: peguei um caderno e escrevi. Escolhi uma foto. Lembrei do jeito, do dia, da temperatura, para que lado ia o vento e o cheiro da água da chuva. A memória tem tantas facetas e faces. A memória tem a cara da gente, e eu te vejo nela.
O fio da memória hoje passou por aqui: cruzou a rua quando eu menos esperava, e eu me peguei sorrindo. Bati a mão, dei de ombros e continuei caminhando, porque minhas memórias levo comigo.
O fio da memória parece tão fino mas, se vem rente, corta e traz dor. Parece um fim de domingo, mas tudo aconteceu num sábado. Claro, são tudo metáforas porque a vida é o significado que a gente dá para ela: qual livro você está lendo neste momento?
O fio da memória tem a cor dos fios do seu cabelo. Tem o sorriso do seu rosto. Tem o cheiro do seu corpo. Tem a voz da sua fala. E, tudo isso, porque eu lembro assim. Porque a memória, num primeiro momento, sequer existia. Mas, depois que se vive, ela aparece e pronto: taí.
Eu hoje cruzei com o fio da memória e o encarei nos olhos - não com coragem, mas com ternura: eu sempre precisei ser corajosa, mas sou fraca no coração. Derreto-me como manteiga, sigo o caminho por não ter jeito. Mas, hoje, o fio da memória passou e eu não disse não. O aceitei, porque o criei um dia na vida e agora só me resta carregá-lo comigo. Ora choro, ora alivio, mas sei que é tudo o modo como olho para ela, a memória doce das coisas que vivi.
O fio da memória: será que eu me lembro?
21 de dez. de 2016
18 de dez. de 2016
Levo meu rumo na minha mão
Mãe combina com mão. E é isso, mãe: levo meu rumo na minha mão.
Caminho para onde vou. Quase a chegar lá. Passos contidos, porém largos. Passos sozinhos. Passos meus.
Mãe, caminho nos trilhos e levo o meu rumo na minha mão.
Filho nasce e faz seu caminho, e então lembra que o rumo é seguir o / com o coração.
Um dia eu nasci e logo em seguida me dei conta. Mas, até lá, passaram-se anos. Mas era como se tudo fosse colocado num espectro do tempo e, como não havia nome, pensou-se que suficiente era respirar.
Mãe, se hoje caminho, levo meu rumo nas minhas mãos.
Um dia eu cresci aos olhos e eu fui ser quem eu era. Eu sempre era eu mesma, até de cabeça para baixo. O pai tenta ter influências, o pai apita com precisão - mãe, se hoje caminho, levo meu rumo nas minhas mãos.
Vieram as outras, aquelas que são depois de mim. Eu continuaria a ser a mesma, a primeira na escuridão. Seguia meus próprios passos, e levava meu rumo na minha mão. Mãe, quem é que me deu o que deveria ser dado naquele momento? E amanhã, quem será? E o dia de ontem, já passou?
Pois pisco meus olhos, pois há cisco nos cílios. Eu lembro que há de seguir e que para baixo é para cima, só não se vê bem porque são dias maravilhosamente nublados. Mãe, que rima com mão, falamos baixo para não acordar o pai, que é resumido pela falta de todas as palavras que existem - elas fogem, é sempre segunda guerra mundial: hoje eu caminho, e levo meu rumo nas minhas mãos.
Caminho para onde vou. Quase a chegar lá. Passos contidos, porém largos. Passos sozinhos. Passos meus.
Mãe, caminho nos trilhos e levo o meu rumo na minha mão.
Filho nasce e faz seu caminho, e então lembra que o rumo é seguir o / com o coração.
Um dia eu nasci e logo em seguida me dei conta. Mas, até lá, passaram-se anos. Mas era como se tudo fosse colocado num espectro do tempo e, como não havia nome, pensou-se que suficiente era respirar.
Mãe, se hoje caminho, levo meu rumo nas minhas mãos.
Um dia eu cresci aos olhos e eu fui ser quem eu era. Eu sempre era eu mesma, até de cabeça para baixo. O pai tenta ter influências, o pai apita com precisão - mãe, se hoje caminho, levo meu rumo nas minhas mãos.
Vieram as outras, aquelas que são depois de mim. Eu continuaria a ser a mesma, a primeira na escuridão. Seguia meus próprios passos, e levava meu rumo na minha mão. Mãe, quem é que me deu o que deveria ser dado naquele momento? E amanhã, quem será? E o dia de ontem, já passou?
Pois pisco meus olhos, pois há cisco nos cílios. Eu lembro que há de seguir e que para baixo é para cima, só não se vê bem porque são dias maravilhosamente nublados. Mãe, que rima com mão, falamos baixo para não acordar o pai, que é resumido pela falta de todas as palavras que existem - elas fogem, é sempre segunda guerra mundial: hoje eu caminho, e levo meu rumo nas minhas mãos.
28 de nov. de 2016
O apanhador no campo de centeio
Era uma vez um apanhador no campo de centeio, em meio a outros apanhadores, quando o campo é o mundo. E essa noite era dele, como também o foram todas as outras.
Ele agora começava a atinar.
Uma vez olhou para a lua e pensou que a luz houvera ofuscado seus olhos.
Passados alguns anos, com muita vida em cada, o campo de centeio floresceu. Era a hora de apanhar a colheita.
Era uma vez um apanhador no campo de centeio esta noite. E também todas as outras: era o seu destino.
Um dia eu acordei e vi que não era de dia: já era noite e o começo da vida se abria para mim. E eu me senti como uma apanhadora no campo de centeio.
E então pensei que apanhadores no campo de centeio escrevem um e-mail com dúvida, vasculham a vida com lupa, dormem sem acordar - ou seria o contrário?
E, então, o apanhador estava pronto, pensara eu. É que quando estamos prontos aparece, diria um meu outro pensamento. E marchei-me para o campo que seria meu porque sempre houvera sido.
Sou uma apanhadora no campo de centeio: planto mudas para a vida. Eu ontem escrevi uma coisa num papel e, passados uns dias (o que seria hoje), ele desabrochou. Eu olhei e li. E, quando a gente lê e vê uma coisa que foi falada para a gente, a gente se pergunta quem foi que escreveu.
Isso, porque eu já havia lido: sábado à noite havia ouvido, anotei e hoje tornei a ver - só que escrito. Eu fico pensando: quem é que me escreveu?!
Eu, como apanhadora no campo de centeio, tenho minha vida toda para semear. É preciso começar cedo para vir logo a colheita, mas sei que meu tempo não passa de uma contagem nos relógios que enfeitam vitrines. Há mais para se ouvir e ver, enquanto a colheita fica pronta num portal do lado oposto que é, afinal, ao lado da gente. O tempo, enquanto isso, passa, mas acho que vai todo para o meu bolso.
Sei que neste momento já não estou mais falando coisa com coisa, e nem escrevendo eu poderia estar, então pego as semeaduras e guardo na bolsa e tomo o caminho que escolhi traçar. Como uma apanhadora no campo de centeio.
Ele agora começava a atinar.
Uma vez olhou para a lua e pensou que a luz houvera ofuscado seus olhos.
Passados alguns anos, com muita vida em cada, o campo de centeio floresceu. Era a hora de apanhar a colheita.
Era uma vez um apanhador no campo de centeio esta noite. E também todas as outras: era o seu destino.
Um dia eu acordei e vi que não era de dia: já era noite e o começo da vida se abria para mim. E eu me senti como uma apanhadora no campo de centeio.
E então pensei que apanhadores no campo de centeio escrevem um e-mail com dúvida, vasculham a vida com lupa, dormem sem acordar - ou seria o contrário?
E, então, o apanhador estava pronto, pensara eu. É que quando estamos prontos aparece, diria um meu outro pensamento. E marchei-me para o campo que seria meu porque sempre houvera sido.
Sou uma apanhadora no campo de centeio: planto mudas para a vida. Eu ontem escrevi uma coisa num papel e, passados uns dias (o que seria hoje), ele desabrochou. Eu olhei e li. E, quando a gente lê e vê uma coisa que foi falada para a gente, a gente se pergunta quem foi que escreveu.
Isso, porque eu já havia lido: sábado à noite havia ouvido, anotei e hoje tornei a ver - só que escrito. Eu fico pensando: quem é que me escreveu?!
Eu, como apanhadora no campo de centeio, tenho minha vida toda para semear. É preciso começar cedo para vir logo a colheita, mas sei que meu tempo não passa de uma contagem nos relógios que enfeitam vitrines. Há mais para se ouvir e ver, enquanto a colheita fica pronta num portal do lado oposto que é, afinal, ao lado da gente. O tempo, enquanto isso, passa, mas acho que vai todo para o meu bolso.
Sei que neste momento já não estou mais falando coisa com coisa, e nem escrevendo eu poderia estar, então pego as semeaduras e guardo na bolsa e tomo o caminho que escolhi traçar. Como uma apanhadora no campo de centeio.
21 de nov. de 2016
Na distância de outra geração
Estou na distância de outra geração. Estamos.
Estou na distância de outra geração, onde não há voz e nem ouvidos e nem fala há. Parece mais um subir de escadas em espiral. Parece um caminho que leva a lugar nenhum.
Porque é assim a distância entre duas gerações: longe. Uma distante da outra, um lugar longínquo, um lugar longe do meu coração. Direi "aqui não mora ninguém", quando me ouvir.
Enquanto isso, caminha-se para longe. Pego meu casaco e sigo o rumo das minhas mãos - diz-se que segue o coração. Ou leva até ele, não sei dizer.
Estou na distancia de outra geração e isso aqui mais parece um lugar do meio. Quanto mais me afasto, mais de mim me aproximo: chego perto de mim e me recebo como um presente do meu próprio destino.
Se pertenço a uma geração e não à outra, não posso estar em dois lugares. E nem ser ninguém mais que eu mesma.
E isso eu não falo; apenas escrevo. Minha voz não foi ouvida mas nunca se calou: dentro de mim um eco tão meu continua.
Na distância de duas gerações há eu e você, há eles e nós. Há o lado de cá e o outro lado. O seguir em frente e o ficar parado. Lados direito e esquerdo, que são também posições políticas. As fotos dos momentos vividos dirão o que aconteceu e serão a história.
Enquanto isso, distanciamo-nos: na distância de duas gerações - lá, estou eu.
Estou na distância de outra geração, onde não há voz e nem ouvidos e nem fala há. Parece mais um subir de escadas em espiral. Parece um caminho que leva a lugar nenhum.
Porque é assim a distância entre duas gerações: longe. Uma distante da outra, um lugar longínquo, um lugar longe do meu coração. Direi "aqui não mora ninguém", quando me ouvir.
Enquanto isso, caminha-se para longe. Pego meu casaco e sigo o rumo das minhas mãos - diz-se que segue o coração. Ou leva até ele, não sei dizer.
Estou na distancia de outra geração e isso aqui mais parece um lugar do meio. Quanto mais me afasto, mais de mim me aproximo: chego perto de mim e me recebo como um presente do meu próprio destino.
Se pertenço a uma geração e não à outra, não posso estar em dois lugares. E nem ser ninguém mais que eu mesma.
E isso eu não falo; apenas escrevo. Minha voz não foi ouvida mas nunca se calou: dentro de mim um eco tão meu continua.
Na distância de duas gerações há eu e você, há eles e nós. Há o lado de cá e o outro lado. O seguir em frente e o ficar parado. Lados direito e esquerdo, que são também posições políticas. As fotos dos momentos vividos dirão o que aconteceu e serão a história.
Enquanto isso, distanciamo-nos: na distância de duas gerações - lá, estou eu.
9 de nov. de 2016
Acima de nós, em redor de nós as palavras voam e, às vezes, pousam
Um dia eu saí da minha atenção a mim e olhei para cima, e observei que havia uma palavra me rondando. Logo, ela se foi para o horizonte e eu achei que ela havia ido. Segui-a: achei um destino.
Outro dia pensei: são tudo palavras. O sentimento que você sente aí dentro do peito tem nome. O seu nome é nome, e eu te chamo pelo nome que dei a ti. E aquele lugar que eu fui um dia também é descrito por uma palavra que vem a ser seu nome. Coisas são apenas palavras e, se não tivessem nome, sequer existiriam. A linguagem é o começo de tudo.
Eu acordei e queria escrever em um caderno - mas, na verdade, era noite. Está sendo agora. E então pensei comigo: será que meus pensamentos podem também vir a ser palavras? E, se eu os escrevo, encaro-os nos olhos? E, por isso, ganham forma? E as ideias? As ideias a que dou nome tornam alguma coisa, porque viraram palavras e então eu fui lá e as fiz. Estou sempre a executar ideias.
Estava rodeada por palavras e, quando olhei, vi: esta, eu te diria; aquela, guardaria para mim; a outra, eu sopraria ao vento para chegar a lugar-nenhum-que-é-todo-lugar.
Aquela tarde eu olhei para uma palavra e, novamente, enxerguei: escrevi. Falei em voz alta, mas estou sempre falando baixinho, bem aqui comigo. É raro me ouvir, pois prefiro pensar e escrever a falar.
Acima do que sou, ao redor de mim as palavras voam: eu as encaro nos olhos, estendo as mãos e as pego.
Acima de mim, ao redor do meu jeito de ser as palavras pousam: nem as chamei. Resta-me escrever. Vou te dizer: te contarei todas as palavras que me aparecem quando penso em você.
2 de nov. de 2016
Se todos fossem iguais a você
Todos aqueles que nos são caros e especiais e inesquecíveis e vivos num lugar da vida da gente são como nós.
Isso, porque só atraímos o que somos. E todas as pessoas incrivelmente lindas por dentro e por fora que cruzaram o nosso caminho eram, simplesmente, igual a gente.
Se todos fossem iguais a você, seriam mesmo.
Eu ontem escutei uma coisa que eu achei muito viva, tão viva que parecia um sopro de vida.
Ainda assim: ah, se todos fossem iguais a você! Seriam como você e eu. Como a ti. Como a mim.
Eu, do lado direito onde levo o coração na mão, e você no seu lado esquerdo que guarda a cor do girassol mais bonito do mundo. E, no meio, há os livros, a sensibilidade, olhar sem falar nada mas dizer tudo, poemas, caminhadas para aonde quer que eu vá, o charme de um fim de tarde em um dia de inverno, o nascer do dia sem o raiar do sol porque o que conta é você estar ao meu lado, conversas profundas que mais parecem aulas de filosofia, pedalar pela cidade em busca de si, ter o coração mais amável do mundo na palma da mão ao alcance de todos, a honestidade nas grandes e pequenas coisas do dia a dia, ficar sem fazer nada porque isso também é fazer tudo, escrever uma coisa que nunca te mandei.
Se todos fossem iguais a você, seriam iguais a mim. Seriam, na verdade, como eu.
Eis a lição.
Isso, porque só atraímos o que somos. E todas as pessoas incrivelmente lindas por dentro e por fora que cruzaram o nosso caminho eram, simplesmente, igual a gente.
Se todos fossem iguais a você, seriam mesmo.
Eu ontem escutei uma coisa que eu achei muito viva, tão viva que parecia um sopro de vida.
Ainda assim: ah, se todos fossem iguais a você! Seriam como você e eu. Como a ti. Como a mim.
Eu, do lado direito onde levo o coração na mão, e você no seu lado esquerdo que guarda a cor do girassol mais bonito do mundo. E, no meio, há os livros, a sensibilidade, olhar sem falar nada mas dizer tudo, poemas, caminhadas para aonde quer que eu vá, o charme de um fim de tarde em um dia de inverno, o nascer do dia sem o raiar do sol porque o que conta é você estar ao meu lado, conversas profundas que mais parecem aulas de filosofia, pedalar pela cidade em busca de si, ter o coração mais amável do mundo na palma da mão ao alcance de todos, a honestidade nas grandes e pequenas coisas do dia a dia, ficar sem fazer nada porque isso também é fazer tudo, escrever uma coisa que nunca te mandei.
Se todos fossem iguais a você, seriam iguais a mim. Seriam, na verdade, como eu.
Eis a lição.
24 de out. de 2016
Teu lábio sorriu e o mundo inteiro ficou feliz
Teu lábio sorriu e não teve jeito: invadiu-me por inteiro, fez-me sentir um leve ardor, aqueceu meu corpo e o mundo inteiro ficou feliz.
Teu lábio sorriu e eu vi: gravei na memória dos meus olhos o que era aquela tamanha beleza.
Teu lábio sorriu e falou para mim: sorria. E eu sorri.
Teu lábio sorriu e o dia no mundo foi assim: as palavras ásperas não eram densas, mas leves, e não mais foram ouvidas; o trem da noite finalmente chegou ao seu destino; tomei meu rumo nas minhas mãos e passei a andar; a jarra de água, que era de vidro, caiu do pedestal e se espatifou sem partir-se ao meio; o sol se pôs porque tudo seguia o seu curso.
Teu lábio, que forma o sorriso mais encantador de que já se teve notícia na história da minha vida, basta sorrir: teu lábio sorriu e o mundo inteiro ficou feliz.
Teu lábio sorriu e eu vi: gravei na memória dos meus olhos o que era aquela tamanha beleza.
Teu lábio sorriu e falou para mim: sorria. E eu sorri.
Teu lábio sorriu e o dia no mundo foi assim: as palavras ásperas não eram densas, mas leves, e não mais foram ouvidas; o trem da noite finalmente chegou ao seu destino; tomei meu rumo nas minhas mãos e passei a andar; a jarra de água, que era de vidro, caiu do pedestal e se espatifou sem partir-se ao meio; o sol se pôs porque tudo seguia o seu curso.
Teu lábio, que forma o sorriso mais encantador de que já se teve notícia na história da minha vida, basta sorrir: teu lábio sorriu e o mundo inteiro ficou feliz.
6 de out. de 2016
Coisas que nunca te disse
Me disseram que eu escrevia como quem segura um lápis e desenha o mundo. E que o meu escrito era bonito.
Até prêmio eu ganhei, passei em provas, em seleções e sobrevivi o mundo. E tudo o que eu fiz foi escrever, como ir me obedecendo.
Um dia eu pensei comigo: mas e as coisas que não falei, como falar assim? E, então, me veio a minha mão com uma ideia: basta escrever.
E assim surgiram as coisas que nunca te disse.
Coisas que nunca te disse são aqueles exatos minutos no tempo em que olhei e te vi: parecia um sol, até no cabelo. São os formatos das palavras que saíam da minha boca, cada uma ao seu som. É o cuidado com que segurei o seu braço, a ponte da vida. É cada preparo que eu não fiz. Sou eu com o meu jeito de me entregar a você, sem a timidez de me revelar. É o aroma que vez ou outra passa despercebido na minha frente e me faz parar.
Há coisas que nunca te disse, mas você bem sabe quais são: todas elas. Porque são tudo o que sou e estou e pensei e olhei e vi e vivi. Era cada pedacinho de mim querendo se revelar no escuro. Essas são as coisas que nunca te disse: eram todas e cada uma delas.
E, das coisas que nunca te disse, pesam mais as que eu te escreveria. Porque eu te escreveria o seu rosto como ele é para mim, te escreveria os seus olhos (porque você vê com eles, mas não os vê; sou eu que os encaro em estado total de encantamento), te escreveria como é o toque das suas mãos. Eu te escreveria o jeito como você anda, te escreveria o modo como você fala certas palavras com seu sotaque, te escreveria a paisagem de um lugar qualquer em que fomos, visto aos meus olhos.
A você, escreveria meus versos curtos e obscuros, mas cheios de significado. Escreveria a cor do céu numa noite em que a lua aparece e eu a noto porque, quando ela sorri, me lembra você. Eu te escreveria poesias que fiz na hora, no momento e no mundo em que conheci você. E também te escreveria todas as poesias que foram feitas antes de mim pelos grandes poetas. Copiaria com letra desenhada por todo carinho do mundo, só para você entender meu jeito de escrever. Tudo para você ler o que eu tenho a dizer.
Eu te escreveria. Escreveria você. Escreveria eu, para você. Escreveria-me toda, revelando-me sem notar.
E das coisas que te disse, eu copiaria trechos só para você lembrar de nunca esquecer: ei, você. Você é tão você que me é único.
E das coisas que nunca te disse - ah! - nessa hora eu seria tomada por um suspiro profundo, porque escrever exige concentração, mas meu coração entra no meio do caminho!
Há coisas que nunca te disse: e eu as diria para você mil vezes. Falaria bem baixinho e pausadamente, para ecoar nos dias da sua vida. E, depois, te escreveria: para ecoar nos minutos do tempo que lhe foi dado. Para nunca deixar de existir: afinal, o que está escrito é.
Por isso, as coisas que eu te disse, e ainda as que nunca te disse, na verdade, eu te escreveria.
Até prêmio eu ganhei, passei em provas, em seleções e sobrevivi o mundo. E tudo o que eu fiz foi escrever, como ir me obedecendo.
Um dia eu pensei comigo: mas e as coisas que não falei, como falar assim? E, então, me veio a minha mão com uma ideia: basta escrever.
E assim surgiram as coisas que nunca te disse.
Coisas que nunca te disse são aqueles exatos minutos no tempo em que olhei e te vi: parecia um sol, até no cabelo. São os formatos das palavras que saíam da minha boca, cada uma ao seu som. É o cuidado com que segurei o seu braço, a ponte da vida. É cada preparo que eu não fiz. Sou eu com o meu jeito de me entregar a você, sem a timidez de me revelar. É o aroma que vez ou outra passa despercebido na minha frente e me faz parar.
Há coisas que nunca te disse, mas você bem sabe quais são: todas elas. Porque são tudo o que sou e estou e pensei e olhei e vi e vivi. Era cada pedacinho de mim querendo se revelar no escuro. Essas são as coisas que nunca te disse: eram todas e cada uma delas.
E, das coisas que nunca te disse, pesam mais as que eu te escreveria. Porque eu te escreveria o seu rosto como ele é para mim, te escreveria os seus olhos (porque você vê com eles, mas não os vê; sou eu que os encaro em estado total de encantamento), te escreveria como é o toque das suas mãos. Eu te escreveria o jeito como você anda, te escreveria o modo como você fala certas palavras com seu sotaque, te escreveria a paisagem de um lugar qualquer em que fomos, visto aos meus olhos.
A você, escreveria meus versos curtos e obscuros, mas cheios de significado. Escreveria a cor do céu numa noite em que a lua aparece e eu a noto porque, quando ela sorri, me lembra você. Eu te escreveria poesias que fiz na hora, no momento e no mundo em que conheci você. E também te escreveria todas as poesias que foram feitas antes de mim pelos grandes poetas. Copiaria com letra desenhada por todo carinho do mundo, só para você entender meu jeito de escrever. Tudo para você ler o que eu tenho a dizer.
Eu te escreveria. Escreveria você. Escreveria eu, para você. Escreveria-me toda, revelando-me sem notar.
E das coisas que te disse, eu copiaria trechos só para você lembrar de nunca esquecer: ei, você. Você é tão você que me é único.
E das coisas que nunca te disse - ah! - nessa hora eu seria tomada por um suspiro profundo, porque escrever exige concentração, mas meu coração entra no meio do caminho!
Há coisas que nunca te disse: e eu as diria para você mil vezes. Falaria bem baixinho e pausadamente, para ecoar nos dias da sua vida. E, depois, te escreveria: para ecoar nos minutos do tempo que lhe foi dado. Para nunca deixar de existir: afinal, o que está escrito é.
Por isso, as coisas que eu te disse, e ainda as que nunca te disse, na verdade, eu te escreveria.
3 de out. de 2016
Ao sul de lugar nenhum
Então aquilo era o sul. Era lugar nenhum. Era o sul de lugar nenhum.
Isso é o que pensava todas as vezes que arrumava a mala, que era mais uma mochila com pouca roupa, porque se salvava (do inglês, "save"; do português, se guardava?) e se permitia para pessoas especiais e em ocasiões especiais, que eram as ocasiões do dia a dia da sua vida.
Então aquilo era ao sul de lugar nenhum, pensara ela. E pensava assim todas as vezes até não querer pensar mais e não poder sentir mais porque queria mesmo apressar os passos que sempre a levariam na direção contrária - contrária a aquilo ali.
Então estava indo ao sul de lugar nenhum: de onde as pessoas vinham, onde esteve mas para onde nunca mais voltou ou existiu. Não era possível existir ali, porque, em seu mundo, existir implicava viver.
Ao sul de lugar nenhum as pessoas vestiam-se iguais, e pensavam iguais, e sequer pensavam. Falavam a mesma língua mas, no final, ninguém falava nada. Todos olhavam na mesma direção sem notarem a própria sombra. Mas então nasceu um dia um ovo ou uma galinha? - não importa a ordem, pois o que vale mesmo é o conhecimento e a indagação que isso gera - não ali, em lugar nenhum, obviamente.
Um dia eu nasci e ali estava: ao sul de lugar nenhum. E então era assim que chamava aquele lugar sombrio que um dia pintou a história mas que nunca habitou coração e, por isso, jamais seria considerado um lugar porque simplesmente não existia.
Se duvidas, pegue um mapa: tente achar esse "lugar nenhum" e verás, simplesmente, que não existe.
Avante, sigamos em frente.
Isso é o que pensava todas as vezes que arrumava a mala, que era mais uma mochila com pouca roupa, porque se salvava (do inglês, "save"; do português, se guardava?) e se permitia para pessoas especiais e em ocasiões especiais, que eram as ocasiões do dia a dia da sua vida.
Então aquilo era ao sul de lugar nenhum, pensara ela. E pensava assim todas as vezes até não querer pensar mais e não poder sentir mais porque queria mesmo apressar os passos que sempre a levariam na direção contrária - contrária a aquilo ali.
Então estava indo ao sul de lugar nenhum: de onde as pessoas vinham, onde esteve mas para onde nunca mais voltou ou existiu. Não era possível existir ali, porque, em seu mundo, existir implicava viver.
Ao sul de lugar nenhum as pessoas vestiam-se iguais, e pensavam iguais, e sequer pensavam. Falavam a mesma língua mas, no final, ninguém falava nada. Todos olhavam na mesma direção sem notarem a própria sombra. Mas então nasceu um dia um ovo ou uma galinha? - não importa a ordem, pois o que vale mesmo é o conhecimento e a indagação que isso gera - não ali, em lugar nenhum, obviamente.
Um dia eu nasci e ali estava: ao sul de lugar nenhum. E então era assim que chamava aquele lugar sombrio que um dia pintou a história mas que nunca habitou coração e, por isso, jamais seria considerado um lugar porque simplesmente não existia.
Se duvidas, pegue um mapa: tente achar esse "lugar nenhum" e verás, simplesmente, que não existe.
Avante, sigamos em frente.
12 de set. de 2016
Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres
Hoje, como em alguns dias, me pego pensando: era uma aprendizagem ou um livro de prazeres?
O rosto desenhado como pela mão de um artista, o cabelo que caía de lado mas não o impedia de ler o livro, a mão que segurou a minha, as pernas moldadas pelo andar de uma bicicleta, os olhos que transpareciam seu também lindo lado de dentro, as marcas pequenas sempre visíveis espalhadas por todo o corpo e, então, o sorriso: seria aquilo tudo uma aprendizagem? Porque mais parecia um livro de prazeres!
E tudo o que foi feito e dito, e não feito e calado, e acontecido e vivido, e criado e postergado. Era tudo uma aprendizagem que um dia eu aprenderia, mas, naquele momento, soava tanto como um livro de prazeres!
Uma mão leve mas pesada a me levar pelos caminhos que iria, uma voz que parecia vir lá de um outro lado do mundo, um sotaque carregado que todo mundo percebia mas eu simplesmente achava lindo. Meu coração se derretia e eu só pensava que aquilo era o livro dos prazeres: há tanto prazer em ler você, que vou até te chamar de "meu livro"!
Tudo na vida é uma aprendizagem ou um livro dos prazeres. Hoje, sei que a minha aprendizagem foi também o meu maior prazer, como o ápice do viver. Algo intransponível que tento contar até hoje para quem me sou - eu, que mudei mas ainda mantenho a minha essência.
Tudo que passa na vida a gente olha e pergunta: é uma aprendizagem? Ou é um livro dos prazeres?
Mas você, ah você, você foi a mais prazerosa aprendizagem que me apareceu na vida, e até hoje escrevo lições no meu caderno.
E, então: você - uma aprendizagem, ou o livros dos prazeres? ;)
O rosto desenhado como pela mão de um artista, o cabelo que caía de lado mas não o impedia de ler o livro, a mão que segurou a minha, as pernas moldadas pelo andar de uma bicicleta, os olhos que transpareciam seu também lindo lado de dentro, as marcas pequenas sempre visíveis espalhadas por todo o corpo e, então, o sorriso: seria aquilo tudo uma aprendizagem? Porque mais parecia um livro de prazeres!
E tudo o que foi feito e dito, e não feito e calado, e acontecido e vivido, e criado e postergado. Era tudo uma aprendizagem que um dia eu aprenderia, mas, naquele momento, soava tanto como um livro de prazeres!
Uma mão leve mas pesada a me levar pelos caminhos que iria, uma voz que parecia vir lá de um outro lado do mundo, um sotaque carregado que todo mundo percebia mas eu simplesmente achava lindo. Meu coração se derretia e eu só pensava que aquilo era o livro dos prazeres: há tanto prazer em ler você, que vou até te chamar de "meu livro"!
Tudo na vida é uma aprendizagem ou um livro dos prazeres. Hoje, sei que a minha aprendizagem foi também o meu maior prazer, como o ápice do viver. Algo intransponível que tento contar até hoje para quem me sou - eu, que mudei mas ainda mantenho a minha essência.
Tudo que passa na vida a gente olha e pergunta: é uma aprendizagem? Ou é um livro dos prazeres?
Mas você, ah você, você foi a mais prazerosa aprendizagem que me apareceu na vida, e até hoje escrevo lições no meu caderno.
E, então: você - uma aprendizagem, ou o livros dos prazeres? ;)
8 de set. de 2016
The Munich Mannequins
Perfection is terrible, it cannot have children
Cold as snow breath, it tamps the womb
[...]
Unloosing their moons, month after month, to no purpose.
The blood flood is the flood of love,
The absolute sacrifice.
It mean: no more idols but me,
Me and You.
So, in their sulfur loveliness, in their smiles
The mannequins lean tonight
In Munich, morgue between Paris and Rome,
[...]
[...]
(by Sylvia Plath)
Those eyes I noticed last Saturday, I had actually seen them two years ago. I had stared when they were not seeing, only looking - those most beautiful eyes, so bright.
We'd just stare, and that was two years ago. And we'd only talk to our common friend, and that was all.
As I look at his eyes, my eyes go through some old pics and I feel nothing - cold as snow breath I am. And I look at another cold snow breath, much whiter than me, but you wouldn't say so - but no. Oh, that's his Aryan soul - but no!
Those bright clear eyes showed me the way to the Munich mannequins as I looked through my old pics. They are nothing but mannequins. Them, the Munich mannequins...
Danke, obrigada, thank you, and, most of all, Merci.
Cold as snow breath, it tamps the womb
[...]
Unloosing their moons, month after month, to no purpose.
The blood flood is the flood of love,
The absolute sacrifice.
It mean: no more idols but me,
Me and You.
So, in their sulfur loveliness, in their smiles
The mannequins lean tonight
In Munich, morgue between Paris and Rome,
[...]
[...]
(by Sylvia Plath)
Those eyes I noticed last Saturday, I had actually seen them two years ago. I had stared when they were not seeing, only looking - those most beautiful eyes, so bright.
We'd just stare, and that was two years ago. And we'd only talk to our common friend, and that was all.
As I look at his eyes, my eyes go through some old pics and I feel nothing - cold as snow breath I am. And I look at another cold snow breath, much whiter than me, but you wouldn't say so - but no. Oh, that's his Aryan soul - but no!
Those bright clear eyes showed me the way to the Munich mannequins as I looked through my old pics. They are nothing but mannequins. Them, the Munich mannequins...
Danke, obrigada, thank you, and, most of all, Merci.
6 de set. de 2016
Condição
Qual a condição?
"Eu sou a condição", pensei.
...
Muitas pessoas acham que amor de pai e mãe é incondicional, mas enganam-se: ama-se os filhos porque, estes, como tais, estão na condição. Na condição de filhos.
E se não fossem seus filhos, amaria-os com amor? Sem condições? Amor incondicional?
...
Na rua da vida passou uma placa escrita. Fitei-a com os olhos e li. A lição eu já sabia.
Qual a condição para ser você? É que quando você nasceu depositaram em ti tudo o que não haviam sido e não tiveram. E você se pergunta: mas se é apenas sendo. Então, vá ser e assim será. E colocou-se aqui o ponto final.
A condição da vida é não estar contida.
Em qual condição você poderia ser você? Em qual condição eu me seria eu? E como ser-me toda minha? Eu, que nasci na condição de filha, pergunto-me ao olhar minha imagem, que também sou eu, refletida no espelho. Há de se olhar para dentro de si, diriam. Mas é que não vejo nada além de mim. Então, tire-se do seu caminho. Mas não se deixe ser abraçada pelos braços do polvo de uma condição. Digo isso porque hoje li Medusa, de Sylvia Plath, e lembrei de Aurelia, a mãe. Antes, havia lido Daddy e lembrado de Otto, o pai. Mas não apenas dele: ach, du - You.
...
Em qual condição eu estaria? Ser eu mesma já não seria condição? É que, se sou eu, sou filha. Mas, não: deve-se ser plateia, ouvidos, uma mulher sem cérebro, um manequim sem coração, eleitorado, governanta, aplausos, microfone, assinatura, concordância dos tempos verbais, gratidão, um lugar ao lado, cinco minutos no relógio, cinco reais a hora, exatidão.
...
"Que o amor do meu pai é condicional, a mais pequena desilusão e perde-se". (Ana de Amsterdam)
"Eu sou a condição", pensei.
...
Muitas pessoas acham que amor de pai e mãe é incondicional, mas enganam-se: ama-se os filhos porque, estes, como tais, estão na condição. Na condição de filhos.
E se não fossem seus filhos, amaria-os com amor? Sem condições? Amor incondicional?
...
Na rua da vida passou uma placa escrita. Fitei-a com os olhos e li. A lição eu já sabia.
Qual a condição para ser você? É que quando você nasceu depositaram em ti tudo o que não haviam sido e não tiveram. E você se pergunta: mas se é apenas sendo. Então, vá ser e assim será. E colocou-se aqui o ponto final.
A condição da vida é não estar contida.
Em qual condição você poderia ser você? Em qual condição eu me seria eu? E como ser-me toda minha? Eu, que nasci na condição de filha, pergunto-me ao olhar minha imagem, que também sou eu, refletida no espelho. Há de se olhar para dentro de si, diriam. Mas é que não vejo nada além de mim. Então, tire-se do seu caminho. Mas não se deixe ser abraçada pelos braços do polvo de uma condição. Digo isso porque hoje li Medusa, de Sylvia Plath, e lembrei de Aurelia, a mãe. Antes, havia lido Daddy e lembrado de Otto, o pai. Mas não apenas dele: ach, du - You.
...
Em qual condição eu estaria? Ser eu mesma já não seria condição? É que, se sou eu, sou filha. Mas, não: deve-se ser plateia, ouvidos, uma mulher sem cérebro, um manequim sem coração, eleitorado, governanta, aplausos, microfone, assinatura, concordância dos tempos verbais, gratidão, um lugar ao lado, cinco minutos no relógio, cinco reais a hora, exatidão.
...
"Que o amor do meu pai é condicional, a mais pequena desilusão e perde-se". (Ana de Amsterdam)
29 de ago. de 2016
O céu sobre os ombros
Quando vejo o caminho ainda úmido, nuvens pesadas e cinzas, prestes a desabar em chuva, paro e penso: é o céu sobre os ombros.
E, assim que começo o caminho e meus passos começam a se ajeitar, toda chuva cai em mim e, num suspiro de sorriso, só tenho a declarar: sim, era o céu sobre os ombros.
Eu já tive o céu ao redor, na frente, atrás e do lado. Mas, confesso, o que mais gosto é quando olho e vejo o céu sobre os ombros.
Porque o céu sobre os ombros, ora visto como o peso nas costas, é o abraço que veio sobre mim. É a lembrança do potencial guardado, é a piscadela rápida enquanto subo correndo uma escada. É esse, sim, o céu sobre os ombros: leve como uma ventania assustadora. Ah.
Eu já tive o céu sobre os ombros e ainda o tenho, mesmo que eu o esqueça de carregar. Lembro de uma vez, que na verdade foram anos, e finalmente o dia que chegou. Lembro de dar 10 passos, olhar para cima, ver um monte de janelas num prédio e falar: "então é aqui". E abrir um sorriso pronto para me levar para o melhor a me esperar.
Eu uma vez tive o céu sobre os ombros, naquela vez em que estive sentada de costas para uma mesa que continha uma gotinha de céu. Tive o céu sobre os ombros naquela manhã que já era quase de tarde e, de ressaca, espiava o olhar mais esperado sobre mim. Tive o céu sobre os ombros quando desci e fui jantar: entre tantas pessoas, a convidada era eu.
O céu sobre os ombros abraçou-me quando, num dia vazio, procurou por eles mas acharam a mim. Falou comigo, e de novo e de novo. E toda conversa virou um novo suspiro, que se alongou pela noite, que recomeçou no outro dia e que durou quase um vida inteira tamanha a sua intensidade.
Eu tive o céu sobre os ombros quando me aventurei a pedir que me levasse em uma aventura: entrar naquele local abandonado, do qual eu morria de medo e só poderia aventurá-lo se estivesse na melhor das companhias: você. Funcionou: nunca entramos naquele lugar, mas estivemos na companhia um do outro por outros vários lugares abandonados que agora eram cheios da gente.
Eu tenho o céu sobre os ombros e o vejo sempre que olho para cima. Vejo-o sempre também quando olho para o lado e, principalmente, quando olho para dentro de mim. Reconheço-o quando leio meus cadernos, quando desenho uma letra ou quando te envio um pensamento meu cheio de inspiração que chega até o outro lado do mundo. Tive e tenho o céu sobre os ombros sempre que estive no melhor de mim e no melhor das pessoas, sendo elas as pessoas certas.
O céu sobre os ombros tomou conta de mim: desceu aqui na Terra e me abraçou num abraço. Falou todas as palavras que eu queria ouvir (eu amo ler palavras - eu vejo palavras em tudo, até no que não é palavra mas desenho). Me deu um beijo e disse-me para perder o juízo sem medo de me encontrar. Me jogou do precipício e esteve lá embaixo para me resgatar. Olhou através de mim e viu além. Me encarou nos olhos sem sequer piscar. Me puxou o cabelo a fim de me lembrar quem sou. Fez tudo o que foi feito para mim desde o dia da Criação com muito carinho. Falou grave como o som do chão, fez-me sentir o cheiro de todas as coisas ao mesmo tempo de uma só vez e gargalhou no último capítulo.
O céu sobre os ombros toma conta de mim. Confesso que muitas vezes esqueço de olhar para ele, pois dentro dele eu moro e vou seguindo como se ao menos pudesse ficar perdida. O céu sobre os ombros veio cá e me puxou.
Eu tenho o céu sobre os ombros e o dia que eu mais gosto na vida é quando eu olho para ele, ele olha para mim, nos reconhecemos e, então, numa piscadela, inicio minha nova história.
Quantas histórias há por vir? :)
E, assim que começo o caminho e meus passos começam a se ajeitar, toda chuva cai em mim e, num suspiro de sorriso, só tenho a declarar: sim, era o céu sobre os ombros.
Eu já tive o céu ao redor, na frente, atrás e do lado. Mas, confesso, o que mais gosto é quando olho e vejo o céu sobre os ombros.
Porque o céu sobre os ombros, ora visto como o peso nas costas, é o abraço que veio sobre mim. É a lembrança do potencial guardado, é a piscadela rápida enquanto subo correndo uma escada. É esse, sim, o céu sobre os ombros: leve como uma ventania assustadora. Ah.
Eu já tive o céu sobre os ombros e ainda o tenho, mesmo que eu o esqueça de carregar. Lembro de uma vez, que na verdade foram anos, e finalmente o dia que chegou. Lembro de dar 10 passos, olhar para cima, ver um monte de janelas num prédio e falar: "então é aqui". E abrir um sorriso pronto para me levar para o melhor a me esperar.
Eu uma vez tive o céu sobre os ombros, naquela vez em que estive sentada de costas para uma mesa que continha uma gotinha de céu. Tive o céu sobre os ombros naquela manhã que já era quase de tarde e, de ressaca, espiava o olhar mais esperado sobre mim. Tive o céu sobre os ombros quando desci e fui jantar: entre tantas pessoas, a convidada era eu.
O céu sobre os ombros abraçou-me quando, num dia vazio, procurou por eles mas acharam a mim. Falou comigo, e de novo e de novo. E toda conversa virou um novo suspiro, que se alongou pela noite, que recomeçou no outro dia e que durou quase um vida inteira tamanha a sua intensidade.
Eu tive o céu sobre os ombros quando me aventurei a pedir que me levasse em uma aventura: entrar naquele local abandonado, do qual eu morria de medo e só poderia aventurá-lo se estivesse na melhor das companhias: você. Funcionou: nunca entramos naquele lugar, mas estivemos na companhia um do outro por outros vários lugares abandonados que agora eram cheios da gente.
Eu tenho o céu sobre os ombros e o vejo sempre que olho para cima. Vejo-o sempre também quando olho para o lado e, principalmente, quando olho para dentro de mim. Reconheço-o quando leio meus cadernos, quando desenho uma letra ou quando te envio um pensamento meu cheio de inspiração que chega até o outro lado do mundo. Tive e tenho o céu sobre os ombros sempre que estive no melhor de mim e no melhor das pessoas, sendo elas as pessoas certas.
O céu sobre os ombros tomou conta de mim: desceu aqui na Terra e me abraçou num abraço. Falou todas as palavras que eu queria ouvir (eu amo ler palavras - eu vejo palavras em tudo, até no que não é palavra mas desenho). Me deu um beijo e disse-me para perder o juízo sem medo de me encontrar. Me jogou do precipício e esteve lá embaixo para me resgatar. Olhou através de mim e viu além. Me encarou nos olhos sem sequer piscar. Me puxou o cabelo a fim de me lembrar quem sou. Fez tudo o que foi feito para mim desde o dia da Criação com muito carinho. Falou grave como o som do chão, fez-me sentir o cheiro de todas as coisas ao mesmo tempo de uma só vez e gargalhou no último capítulo.
O céu sobre os ombros toma conta de mim. Confesso que muitas vezes esqueço de olhar para ele, pois dentro dele eu moro e vou seguindo como se ao menos pudesse ficar perdida. O céu sobre os ombros veio cá e me puxou.
Eu tenho o céu sobre os ombros e o dia que eu mais gosto na vida é quando eu olho para ele, ele olha para mim, nos reconhecemos e, então, numa piscadela, inicio minha nova história.
Quantas histórias há por vir? :)
28 de ago. de 2016
O lobo da estepe
Eis o lobo da estepe: você.
Um dia eu ganhei um livro de uma colega de trabalho no meu último dia. Eu havia decidido ir seguir o meu caminho mas, antes, me deram alguns livros. E uma bebida alcoólica, e um chocolate.
Era a segunda vez que eu me encontrava com o lobo da estepe. Olhei para a capa do livro e pensei: "era ele". (na verdade, "é você". É que estou falando de algo que aconteceu no passado)
Eu havia posto todas as minhas expectativas em O Lobo da Estepe e, por isso, li o livro sem ler, sabe como? Eu lia, mas não nutria. Eu não queria assimilar nada, nem aprender nada, nem saber nada: eu só queria experenciar. Eu olhava para as letras e as deixava dizer uma coisa para mim, esperando.
Um dia eu encontrei um lobo da estepe e era um lobo com os olhos mais bonitos que eu já vi. Tinha também o sorriso mais derretedor do meu coração no mundo. Mas era um lobo da estepe.
Eu hoje fazia colagens com minha irmã quando escutei Wolf Girl, de uma banda norueguesa-não-indicada-pela-minha-outra-irmã (e por isso descobri sozinha). [Não ficava necessariamente alegre quando escutava esta música, pois used to listen to it quando eu morava em Budapeste - mais precisamente, no espaço de um tempo que foi o dia em que li uma coisa escrita que ele me escreveu. Eu morava com a Angela e passei a gastar a maior parte do meu dia no quarto dela. Eu comia torrada com Nutella e nada mais. Eu perdi 7 kg nessa de só comer torrada com Nutella e nada mais. Eu li uma coisa que alguém me escreveu e encheu meu olho d'água como resultado do processo que se desenvolvia dentro do meu coração. Eu acordava e corria para a cama da Angela. Eu passava a maior parte do meu tempo no quarto dela, com ou sem ela.] - Neste momento, minha irmã levanta o rosto, me fita os olhos e diz: ele te disse isso? Oh, minha irmã, ele é um lobo da estepe, don't you know?
E, como os olhos mais belos do mundo, o lobo da estepe engana como folhas no verão: vão morrer logo, pois do verão ninguém escapa.
Era uma vez eu e um livro que encontrei jogado em meio a um monte de bagunça em um quarto dividido onde não se dormiu. Ficava na cidade do fim do mundo. O livro se chamava O Lobo da Estepe e tenho em mente a capa até hoje: uma mulher, e um lobo, e umas coisas num fundo branco. Lembro que quem lia o livro também era o lobo da estepe. Passado alguns anos, o livro veio parar nas minhas mãos como um presente de uma amiga: eu leria, mas já havia descoberto quem era o lobo da estepe e o motivo daquele ser o nome.
Era uma vez o lobo da estepe - e seu pêlo era tão lindo! - mas era um lobo.
Um dia eu ganhei um livro de uma colega de trabalho no meu último dia. Eu havia decidido ir seguir o meu caminho mas, antes, me deram alguns livros. E uma bebida alcoólica, e um chocolate.
Era a segunda vez que eu me encontrava com o lobo da estepe. Olhei para a capa do livro e pensei: "era ele". (na verdade, "é você". É que estou falando de algo que aconteceu no passado)
Eu havia posto todas as minhas expectativas em O Lobo da Estepe e, por isso, li o livro sem ler, sabe como? Eu lia, mas não nutria. Eu não queria assimilar nada, nem aprender nada, nem saber nada: eu só queria experenciar. Eu olhava para as letras e as deixava dizer uma coisa para mim, esperando.
Um dia eu encontrei um lobo da estepe e era um lobo com os olhos mais bonitos que eu já vi. Tinha também o sorriso mais derretedor do meu coração no mundo. Mas era um lobo da estepe.
Eu hoje fazia colagens com minha irmã quando escutei Wolf Girl, de uma banda norueguesa-não-indicada-pela-minha-outra-irmã (e por isso descobri sozinha). [Não ficava necessariamente alegre quando escutava esta música, pois used to listen to it quando eu morava em Budapeste - mais precisamente, no espaço de um tempo que foi o dia em que li uma coisa escrita que ele me escreveu. Eu morava com a Angela e passei a gastar a maior parte do meu dia no quarto dela. Eu comia torrada com Nutella e nada mais. Eu perdi 7 kg nessa de só comer torrada com Nutella e nada mais. Eu li uma coisa que alguém me escreveu e encheu meu olho d'água como resultado do processo que se desenvolvia dentro do meu coração. Eu acordava e corria para a cama da Angela. Eu passava a maior parte do meu tempo no quarto dela, com ou sem ela.] - Neste momento, minha irmã levanta o rosto, me fita os olhos e diz: ele te disse isso? Oh, minha irmã, ele é um lobo da estepe, don't you know?
E, como os olhos mais belos do mundo, o lobo da estepe engana como folhas no verão: vão morrer logo, pois do verão ninguém escapa.
Era uma vez eu e um livro que encontrei jogado em meio a um monte de bagunça em um quarto dividido onde não se dormiu. Ficava na cidade do fim do mundo. O livro se chamava O Lobo da Estepe e tenho em mente a capa até hoje: uma mulher, e um lobo, e umas coisas num fundo branco. Lembro que quem lia o livro também era o lobo da estepe. Passado alguns anos, o livro veio parar nas minhas mãos como um presente de uma amiga: eu leria, mas já havia descoberto quem era o lobo da estepe e o motivo daquele ser o nome.
Era uma vez o lobo da estepe - e seu pêlo era tão lindo! - mas era um lobo.
18 de ago. de 2016
É cada coisa que escrevo só para dizer que te amo
É cada coisa que escrevo, e outras tantas que não escrevo, só para dizer o indizível: que te amo.
Todas aquelas vezes: quando sentei na mesa para jantar - cada uma daquelas vezes, apressar o passo e torcer para que você viesse, quando te defendi dentro de um ônibus e você nunca soube porque eu nem te contei, as manias que peguei de você e incorporei ao meu repertório de ser eu, quando te apresentei o amaciante de roupas, todas as vezes que falei de você, o pedido para me levar num lugar do qual na verdade eu morria de medo, quando abriu a porta do elevador com os pés e meu coração parou, te olhar de relance enquanto você não via e reparar cada detalhe seu e guardá-los para sempre, minha inspiração para escrever artigos e também a falta dela, os chocolates que lhe comprei e deixei sobre a mesa que você nem usava num quarto onde você não dormia, a ligação em que lhe falei em sussurros de saudade.
E tantas outras coisas das quais não lembro, e outras das quais eu sequer estava aware of, e as outras que sei que existiram. Tantas, tantas, tantas coisas que não eram coisas: eram tudo gestos meus.
Era tudo para dizer que te amo, embora nunca dissesse. Embora nunca te disse.
É cada coisa que escrevo, e tudo se resume ao bater das asas de uma borboleta: é pequeno, é singelo, é até escondido, mas há. Porque é. Será que um dia ainda vai ser? (I wonder)
É cada coisa que escrevo só para não dizer que te amo, quando te amo tanto. Falo de mim, falo das coisas, troco o nome das pessoas. Mudo o assunto, uso metáforas, sinto o cheiro e o traduzo em palavras. Ah, é cada coisa...
É cada coisa que eu sinto quando sinto que te amo. O sentimento parece uma cidade imensa e vazia que habita dentro de mim. Nela, mora o meu coração tão tenro. É como se eu fosse um jardim de uma casa com um gramado verde na frente, mas, que na Hungria, vira depósito. Aí chega você e tudo fica florido: as árvores são, o céu está, a rua passa. E eu sinto tudo outra vez.
Parece um pássaro, parece um caderno pronto para ser escrito, é como uma folha toda rascunhada do maior carinho meu, é a fotografia de uma lembrança, é aquela melodia de filme, é um olhar no espelho, é um parar no tempo de apenas dois segundos, é eu me dar conta de mim: isso é um eu te amo.
É cada coisa que escrevo só para dizer que te amo: todas as poesias, todas elas. Todas as linhas redigidas como se fossem o palpitar do meu coração. As palavras, cada uma das palavras que escolho escrever. O verbo no infinito, o uso do gerúndio. Há ainda os tempos verbais que não sei, os que uso de forma errada e ainda os que criei: é tudo porque te amo. As citações. A foto de Virginia Woolf pensativa. Os retratos de Sylvia Plath no meu quarto que me encaram de forma tácita - e eu nem sei o que é isso! As cartas de Fitzgerald que não lhe escrevi, mas que tanto lhe escreveria. As coisas que te contei e as que nem te contei ainda. Os lugares que fui, os caminhos por onde caminhei. As vezes que não cruzei com seu rosto por toda parte mas, ainda assim, te levei comigo. A frieza de Hemingway, de onde tiro ternura e envio a você.
É tudo para dizer do meu amor a você, que tanto amo.
Todas aquelas vezes: quando sentei na mesa para jantar - cada uma daquelas vezes, apressar o passo e torcer para que você viesse, quando te defendi dentro de um ônibus e você nunca soube porque eu nem te contei, as manias que peguei de você e incorporei ao meu repertório de ser eu, quando te apresentei o amaciante de roupas, todas as vezes que falei de você, o pedido para me levar num lugar do qual na verdade eu morria de medo, quando abriu a porta do elevador com os pés e meu coração parou, te olhar de relance enquanto você não via e reparar cada detalhe seu e guardá-los para sempre, minha inspiração para escrever artigos e também a falta dela, os chocolates que lhe comprei e deixei sobre a mesa que você nem usava num quarto onde você não dormia, a ligação em que lhe falei em sussurros de saudade.
E tantas outras coisas das quais não lembro, e outras das quais eu sequer estava aware of, e as outras que sei que existiram. Tantas, tantas, tantas coisas que não eram coisas: eram tudo gestos meus.
Era tudo para dizer que te amo, embora nunca dissesse. Embora nunca te disse.
É cada coisa que escrevo, e tudo se resume ao bater das asas de uma borboleta: é pequeno, é singelo, é até escondido, mas há. Porque é. Será que um dia ainda vai ser? (I wonder)
É cada coisa que escrevo só para não dizer que te amo, quando te amo tanto. Falo de mim, falo das coisas, troco o nome das pessoas. Mudo o assunto, uso metáforas, sinto o cheiro e o traduzo em palavras. Ah, é cada coisa...
É cada coisa que eu sinto quando sinto que te amo. O sentimento parece uma cidade imensa e vazia que habita dentro de mim. Nela, mora o meu coração tão tenro. É como se eu fosse um jardim de uma casa com um gramado verde na frente, mas, que na Hungria, vira depósito. Aí chega você e tudo fica florido: as árvores são, o céu está, a rua passa. E eu sinto tudo outra vez.
Parece um pássaro, parece um caderno pronto para ser escrito, é como uma folha toda rascunhada do maior carinho meu, é a fotografia de uma lembrança, é aquela melodia de filme, é um olhar no espelho, é um parar no tempo de apenas dois segundos, é eu me dar conta de mim: isso é um eu te amo.
É cada coisa que escrevo só para dizer que te amo: todas as poesias, todas elas. Todas as linhas redigidas como se fossem o palpitar do meu coração. As palavras, cada uma das palavras que escolho escrever. O verbo no infinito, o uso do gerúndio. Há ainda os tempos verbais que não sei, os que uso de forma errada e ainda os que criei: é tudo porque te amo. As citações. A foto de Virginia Woolf pensativa. Os retratos de Sylvia Plath no meu quarto que me encaram de forma tácita - e eu nem sei o que é isso! As cartas de Fitzgerald que não lhe escrevi, mas que tanto lhe escreveria. As coisas que te contei e as que nem te contei ainda. Os lugares que fui, os caminhos por onde caminhei. As vezes que não cruzei com seu rosto por toda parte mas, ainda assim, te levei comigo. A frieza de Hemingway, de onde tiro ternura e envio a você.
É tudo para dizer do meu amor a você, que tanto amo.
17 de ago. de 2016
Morangos mofados
Pensara eu que a validade das coisas começava a contar no dia em que foram criadas. Aliás, no dia em que foram criadas, não - no dia em que passaram a existir, isso sim.
Mas, e se nunca existiram? - perguntava a outra voz dela. E eu, então, a calava.
E, se nunca existiram, é porque nunca foram criadas? - ressoava, assim desse modo, a outra voz.
E então entrava um filósofo a contar histórias: "tudo havia sido criado no dia em que fora feito. a precisão do tempo, não se sabe. Para uns é contada em segundos; para outros, em frações de anos. Ela, no entanto, os conta nas datas de aniversários, embora haja infinitas linhas invisíveis entre eles em que coisas incríveis acontecem. Nos lembraremos do que?".
Ora, bolas. Eu não havia entendido nada, mas já sabia a resposta para o momento. É que eu mesma criara tudo na minha cabeça e dava voz aos personagens, chegando a chamá-los de filósofos. "Imagina se um dia eu escrevo um livro...", e então me deparei com o fato de eu estar divagando para fugir do que estava ali.
De volta para o lugar em que começou, eis como segue a história: era uma vez uma menina, e um pai e uma mãe, e então outras duas meninas. Eram 3, no total. Mas eram nulas, eram zero e eram nenhuma. E foi assim por muitos anos, que pareciam datas mas eram apenas a passagem do tempo. Até que, um dia, um trem passou e, nele, lia-se num cartaz afixado: "morangos mofados".
Então era isso.
Então era isso e ela correu para escrever num papel. Tivera uma visão além do tempo, como se o coração fosse tocado, não da forma bruta, mas com toda a suavidade de uma folha. Era então este o segredo.
Um dia tudo passa e até o que vem passando será passado. As flores terão brotado, as rochas mudarão de lugar, a água continuará seu percurso descendo rios e o vento será não mais que um sopro. O tempo é este porque só existe o agora. O ontem já se foi e o amanhã ainda não veio. O código para tudo isso é lido por muitos mas entendido por poucos, e lhe foi entregue em mãos no dia da Criação.
Enquanto isso, será ela mesma: eu, você. Vá sendo, porque o jeito é ir e ser si mesma. Neste momento, uma menina que segura na mão do pai passa na sua frente, mas, no tempo de um piscar de olhos dá-se conta de que se trata de uma Visão.
Pai - !.
Guarde os morangos, mas vá. Para que não fiquem mofados.
Mas, e se nunca existiram? - perguntava a outra voz dela. E eu, então, a calava.
E, se nunca existiram, é porque nunca foram criadas? - ressoava, assim desse modo, a outra voz.
E então entrava um filósofo a contar histórias: "tudo havia sido criado no dia em que fora feito. a precisão do tempo, não se sabe. Para uns é contada em segundos; para outros, em frações de anos. Ela, no entanto, os conta nas datas de aniversários, embora haja infinitas linhas invisíveis entre eles em que coisas incríveis acontecem. Nos lembraremos do que?".
Ora, bolas. Eu não havia entendido nada, mas já sabia a resposta para o momento. É que eu mesma criara tudo na minha cabeça e dava voz aos personagens, chegando a chamá-los de filósofos. "Imagina se um dia eu escrevo um livro...", e então me deparei com o fato de eu estar divagando para fugir do que estava ali.
De volta para o lugar em que começou, eis como segue a história: era uma vez uma menina, e um pai e uma mãe, e então outras duas meninas. Eram 3, no total. Mas eram nulas, eram zero e eram nenhuma. E foi assim por muitos anos, que pareciam datas mas eram apenas a passagem do tempo. Até que, um dia, um trem passou e, nele, lia-se num cartaz afixado: "morangos mofados".
Então era isso.
Então era isso e ela correu para escrever num papel. Tivera uma visão além do tempo, como se o coração fosse tocado, não da forma bruta, mas com toda a suavidade de uma folha. Era então este o segredo.
Um dia tudo passa e até o que vem passando será passado. As flores terão brotado, as rochas mudarão de lugar, a água continuará seu percurso descendo rios e o vento será não mais que um sopro. O tempo é este porque só existe o agora. O ontem já se foi e o amanhã ainda não veio. O código para tudo isso é lido por muitos mas entendido por poucos, e lhe foi entregue em mãos no dia da Criação.
Enquanto isso, será ela mesma: eu, você. Vá sendo, porque o jeito é ir e ser si mesma. Neste momento, uma menina que segura na mão do pai passa na sua frente, mas, no tempo de um piscar de olhos dá-se conta de que se trata de uma Visão.
Pai - !.
Guarde os morangos, mas vá. Para que não fiquem mofados.
5 de ago. de 2016
Horas para gastar
Então era assim que se chamavam estes últimos dias: horas para gastar.
Alguns dias são anos.
Se aquele é o seu, este é meu, porque quem faz meu tempo sou eu. Se acordo de manhã, já abro os olhos. E, se quero, volto a fechar. Se levanto, me arrasto. Se me arrasto, danço e deito.
Essas são minhas horas para gastar: e eu faço-as como quiser, e as crio tão belas! Nunca almoço ao meio dia - sempre preferi jantar. Café da manhã é um copo de leite porque, quando se pisca, já é segunda-feira. No meio do dia, pausa para viver: é que eu gosto tanto de olhar para a Hora e vê-la passar. Passa sobre mim, passa para mim, passa por mim: mas passa sempre comigo.
Um dia na vida fizemos uma fila, e nos foi dada uma prancheta de papel. "Toma, escreve aí todos os desejos, porque lhe serão dadas horas para gastar", ressoou ao vento. E então eu fui. E desde então tenho vivido.
Se paro e penso, logo sinto: não faço hora; a hora que me é dada é gastada.
Um dia na vida é como Hora para gastar: e eu nunca sei se durmo até tarde ou se levanto cedo - afinal, o que é aproveitar o dia?
Mas, e se você tivesse apenas mais 24 horas disponíveis e, então, fim?! Ah, eu viveria cada uma delas! E teria vivido 24 horas vezes mil, porque há dentro das horas os minutos e, dentro deles, os segundos. Quando tempo há ainda!
Eu tenho horas para gastar e sou uma pessoa criativa. Eu tenho horas para gastar, mas sou também preguiçosa. E está bem, está tudo sempre bem. Mas é que um dia, quando eu acordo mais na metade de um eu (é que todos temos duas metades - é isso que nos faz inteiros), corro e penso, paro e sinto, divago, mas caminho.
Uma palavra que eu escrevi; uma foto que parou o tempo; uma comida que eu cozinhei para mim e depois até comi (quando cozinho, perco a fome); um lugar que eu visitei; o jeito das pessoas andarem; outro lugar que eu morei um dia; um "oi" e um "olá"; um recado na porta do quarto; um vidro que me deixa ver a vida enquanto arrumo as coisas que tem cada uma o seu próprio nome; uma lembrança ou outra, e, quem sabe, as duas; um esconderijo ainda nem descoberto mas que eu já vi; uma noite que dura o dia inteiro; um assobio só para chamar seu nome; um momento que eu olhei e vi; uma volta de carro, só mais uma; o sorriso e os olhos; aquela taça de sorvete; meus banhos quentes nunca frios; o contorno do seu corpo; o teto do mundo; uns cadernos; o portão da casa ao lado que era como entrar num livro; um tesouro ao meu lado; todo o som ao redor; e os gestos tão meus.
E no fim do dia reflito: afinal, viver a vida é gastá-la ou salvá-la?
Que não se esqueçam: só se salva quem vive.
Alguns dias são anos.
Se aquele é o seu, este é meu, porque quem faz meu tempo sou eu. Se acordo de manhã, já abro os olhos. E, se quero, volto a fechar. Se levanto, me arrasto. Se me arrasto, danço e deito.
Essas são minhas horas para gastar: e eu faço-as como quiser, e as crio tão belas! Nunca almoço ao meio dia - sempre preferi jantar. Café da manhã é um copo de leite porque, quando se pisca, já é segunda-feira. No meio do dia, pausa para viver: é que eu gosto tanto de olhar para a Hora e vê-la passar. Passa sobre mim, passa para mim, passa por mim: mas passa sempre comigo.
Um dia na vida fizemos uma fila, e nos foi dada uma prancheta de papel. "Toma, escreve aí todos os desejos, porque lhe serão dadas horas para gastar", ressoou ao vento. E então eu fui. E desde então tenho vivido.
Se paro e penso, logo sinto: não faço hora; a hora que me é dada é gastada.
Um dia na vida é como Hora para gastar: e eu nunca sei se durmo até tarde ou se levanto cedo - afinal, o que é aproveitar o dia?
Mas, e se você tivesse apenas mais 24 horas disponíveis e, então, fim?! Ah, eu viveria cada uma delas! E teria vivido 24 horas vezes mil, porque há dentro das horas os minutos e, dentro deles, os segundos. Quando tempo há ainda!
Eu tenho horas para gastar e sou uma pessoa criativa. Eu tenho horas para gastar, mas sou também preguiçosa. E está bem, está tudo sempre bem. Mas é que um dia, quando eu acordo mais na metade de um eu (é que todos temos duas metades - é isso que nos faz inteiros), corro e penso, paro e sinto, divago, mas caminho.
Uma palavra que eu escrevi; uma foto que parou o tempo; uma comida que eu cozinhei para mim e depois até comi (quando cozinho, perco a fome); um lugar que eu visitei; o jeito das pessoas andarem; outro lugar que eu morei um dia; um "oi" e um "olá"; um recado na porta do quarto; um vidro que me deixa ver a vida enquanto arrumo as coisas que tem cada uma o seu próprio nome; uma lembrança ou outra, e, quem sabe, as duas; um esconderijo ainda nem descoberto mas que eu já vi; uma noite que dura o dia inteiro; um assobio só para chamar seu nome; um momento que eu olhei e vi; uma volta de carro, só mais uma; o sorriso e os olhos; aquela taça de sorvete; meus banhos quentes nunca frios; o contorno do seu corpo; o teto do mundo; uns cadernos; o portão da casa ao lado que era como entrar num livro; um tesouro ao meu lado; todo o som ao redor; e os gestos tão meus.
E no fim do dia reflito: afinal, viver a vida é gastá-la ou salvá-la?
Que não se esqueçam: só se salva quem vive.
2 de ago. de 2016
O som do coração
Eis o som do coração - e ele chega, de fininho, muito estridente.
Este é o som do coração: cujo nome não posso falar.
Ele grita como um sussurro não ouvido; soletra cada palavra como a gritar.
Eis o som do coração: quando já vem, sei que está vindo.
O som do coração foi uma vez silenciado. Coloquei a mão em sua boca e tampei meu coração todo. Ele dormiu, ele morreu - já nem sei. Ele esqueceu e foi esquecido. Mas aí um dia, um dia, ele acordou e falou: eis me aqui, o som e o coração.
O som do coração tem seu nome escrito. O som do coração foi nomeado depois de mim. O som do coração fala baixo e ressoa barulhos de ondas de um mar. O som do coração é a parte mais minha e, por isso, estou a escondê-lo, para guardar o segredo. Se lhe escuto, revelo-me todinha.
Vem ali o som do coração: abaixo a cabeça pois sei que me abraçará todinha. Me envolverá como um fenômeno da natureza selvagem, o qual não sei o nome. Me entregará como um carteiro entrega o papel escrito. Vou lhe contar o segredo: eis aqui o som do meu coração, e ele tem seu nome escrito.
Ontem fui visitada pelo som do meu coração. Fazia um barulho alto que eu não queria. Tapei os ouvidos e deixei-me deitar e estender nesta cama do mundo. Esperei o minuto, que virou hora, que quase durou um dia passar. Fui paciente com tal barulho, fui delicada comigo, fui paciente com o tempo. Deixe estar - disse o som que vinha do coração.
Era uma vez um coração que falava mas vivia calado. Afugentei-me nele e mordi a língua. Guardei cada palavra então para mim. Olhei para as minhas mãos, que redigiam o significado. Ouvi bater os acordes no meu peito - e pensei: será que mais alguém escuta o nome disso?
Eis o som do meu coração: ora isso, ora aquilo. Mas o coração a gente leva dentro do peito - que remédio há?
Este é o som do coração: cujo nome não posso falar.
Ele grita como um sussurro não ouvido; soletra cada palavra como a gritar.
Eis o som do coração: quando já vem, sei que está vindo.
O som do coração foi uma vez silenciado. Coloquei a mão em sua boca e tampei meu coração todo. Ele dormiu, ele morreu - já nem sei. Ele esqueceu e foi esquecido. Mas aí um dia, um dia, ele acordou e falou: eis me aqui, o som e o coração.
O som do coração tem seu nome escrito. O som do coração foi nomeado depois de mim. O som do coração fala baixo e ressoa barulhos de ondas de um mar. O som do coração é a parte mais minha e, por isso, estou a escondê-lo, para guardar o segredo. Se lhe escuto, revelo-me todinha.
Vem ali o som do coração: abaixo a cabeça pois sei que me abraçará todinha. Me envolverá como um fenômeno da natureza selvagem, o qual não sei o nome. Me entregará como um carteiro entrega o papel escrito. Vou lhe contar o segredo: eis aqui o som do meu coração, e ele tem seu nome escrito.
Ontem fui visitada pelo som do meu coração. Fazia um barulho alto que eu não queria. Tapei os ouvidos e deixei-me deitar e estender nesta cama do mundo. Esperei o minuto, que virou hora, que quase durou um dia passar. Fui paciente com tal barulho, fui delicada comigo, fui paciente com o tempo. Deixe estar - disse o som que vinha do coração.
Era uma vez um coração que falava mas vivia calado. Afugentei-me nele e mordi a língua. Guardei cada palavra então para mim. Olhei para as minhas mãos, que redigiam o significado. Ouvi bater os acordes no meu peito - e pensei: será que mais alguém escuta o nome disso?
Eis o som do meu coração: ora isso, ora aquilo. Mas o coração a gente leva dentro do peito - que remédio há?
31 de jul. de 2016
O primeiro jornal (ou o último)
Nunca sabia se era o primeiro jornal ou o último.
Olhava pela janela a hora passar, se arrumava toda para ir a lugar nenhum. Escutava o vento passar como uma pomba que voa. Escovava os dentes porque era assim o ritual.
Um dia ela acordou de dia. Era manhã e era vida. Era tudo quase do jeito que tinha que ser. Ela então foi ler os jornais e ler os sinais: todas as notícias do mundo eram iguais - afinal, seria isso o primeiro jornal ou o último?
O celular apitou e era alguém do país onde está a Alsácia-Lorena: seu amigo lhe avisara que estava como era, e que ela o conhecia. Sim, pensou consigo: está tudo do mesmo jeito - embora novo, continua igual: afinal, isso é ser primeiro ou ser último?
Um dia as manhãs de sábado amanheceram amarelas mas sem sol. O céu tinha, finalmente, a cor que a gente pinta. Ela ficou olhando para os próprios pés. Ela sairia correndo para casa-em-lugar-nenhum a qualquer momento porque as pessoas, no final, a cansavam. Mas havia sempre seu sorriso em seu rosto, até nos pequenos momentos. Enquanto isso, fixava o olhar no morro povoado por casebres ao fim da rua e perguntava: isso é primeiro? Ou último?
Um dia ela começou o dia toda animada. E foi passando os segundos que a levaram até a exaustão. Ao fim de uma tarde, era ela e estava: sua cama parecia um conforto, mas sentia-se desavisada. Ah, quanto há para se viver! Vamos correr porque hoje soa como o primeiro dia, mas pode ser o último!
Um dia todas as folhas caíram das árvores e todas as folhas de um caderno foram escritas. Um dia ela enviou todas as palavras que um dia escreveu. Um dia ela ligou só para ouvir a voz, mas não falou nada. Um dia ela tocou novamente aquela música que mudava o momento atual de lugar. Um dia ela pisou em um espinho que entrou no seu pé. Um dia ela comprou uma coisa e pensou: isso, é só para enfeitar. Um dia ela usou outra coisa que havia comprado. Um dia ela disse que nunca mais compraria nada. Um dia ela buscou a si mesma naquele lugar em que se deixou desamparada. Um dia ela levantou e olhou e viu.
Enquanto isso, andava os dias a pensar quando aconteciam as coisas boas: esse jornal, afinal, é o primeiro ou o último?
Olhava pela janela a hora passar, se arrumava toda para ir a lugar nenhum. Escutava o vento passar como uma pomba que voa. Escovava os dentes porque era assim o ritual.
Um dia ela acordou de dia. Era manhã e era vida. Era tudo quase do jeito que tinha que ser. Ela então foi ler os jornais e ler os sinais: todas as notícias do mundo eram iguais - afinal, seria isso o primeiro jornal ou o último?
O celular apitou e era alguém do país onde está a Alsácia-Lorena: seu amigo lhe avisara que estava como era, e que ela o conhecia. Sim, pensou consigo: está tudo do mesmo jeito - embora novo, continua igual: afinal, isso é ser primeiro ou ser último?
Um dia as manhãs de sábado amanheceram amarelas mas sem sol. O céu tinha, finalmente, a cor que a gente pinta. Ela ficou olhando para os próprios pés. Ela sairia correndo para casa-em-lugar-nenhum a qualquer momento porque as pessoas, no final, a cansavam. Mas havia sempre seu sorriso em seu rosto, até nos pequenos momentos. Enquanto isso, fixava o olhar no morro povoado por casebres ao fim da rua e perguntava: isso é primeiro? Ou último?
Um dia ela começou o dia toda animada. E foi passando os segundos que a levaram até a exaustão. Ao fim de uma tarde, era ela e estava: sua cama parecia um conforto, mas sentia-se desavisada. Ah, quanto há para se viver! Vamos correr porque hoje soa como o primeiro dia, mas pode ser o último!
Um dia todas as folhas caíram das árvores e todas as folhas de um caderno foram escritas. Um dia ela enviou todas as palavras que um dia escreveu. Um dia ela ligou só para ouvir a voz, mas não falou nada. Um dia ela tocou novamente aquela música que mudava o momento atual de lugar. Um dia ela pisou em um espinho que entrou no seu pé. Um dia ela comprou uma coisa e pensou: isso, é só para enfeitar. Um dia ela usou outra coisa que havia comprado. Um dia ela disse que nunca mais compraria nada. Um dia ela buscou a si mesma naquele lugar em que se deixou desamparada. Um dia ela levantou e olhou e viu.
Enquanto isso, andava os dias a pensar quando aconteciam as coisas boas: esse jornal, afinal, é o primeiro ou o último?
20 de jul. de 2016
A streetcar named desire
It's always when I'm driving my car. My beautiful car, because I don't care about cars. But there's a D in my car.
I'm driving throughout the city. I've got nowhere to go. And you, where are you where have you been? Wait - did I just pass by desire street?
By the way, I don't like plays, I didn't take that "drama class" back in college, I was so proud of me for not taking it, though I've read a few plays. By the way, my favorite play is Waiting for Godot, oh, and The Glass Menagerie. And any and all by Oscar Wilde because it's Oscar Wilde, who was born on the same day as my mom - I've always knew that even when I wasn't aware of it.
By the way, I don't like plays. I was sorry for that girl who once went to a Shakespeare play which took place right in front of the Old Main depending on where you were. I mean, who cares if you want to go to plays when I don't even like reading Shakespeare?
A streetcar takes me to a place called desire. It's where you are. Where have you been?
A streetcar named desire lives inside my heart and therefore it beats faster. Last Saturday this Professor asked me "in what language do you write", and I was stuck in my mind. I can't say; I only write.
A streetcar named desire takes all writing to you. (Oh, they all lead to you in the end). Because my writings are the breaths of my heart. But some times they're nothing. It's all true, but not always accurate. It's drama, so I play.
By the way, I don't like plays. But I like your name: like a streetcar, it's named "desire".
I'm driving throughout the city. I've got nowhere to go. And you, where are you where have you been? Wait - did I just pass by desire street?
By the way, I don't like plays, I didn't take that "drama class" back in college, I was so proud of me for not taking it, though I've read a few plays. By the way, my favorite play is Waiting for Godot, oh, and The Glass Menagerie. And any and all by Oscar Wilde because it's Oscar Wilde, who was born on the same day as my mom - I've always knew that even when I wasn't aware of it.
By the way, I don't like plays. I was sorry for that girl who once went to a Shakespeare play which took place right in front of the Old Main depending on where you were. I mean, who cares if you want to go to plays when I don't even like reading Shakespeare?
A streetcar takes me to a place called desire. It's where you are. Where have you been?
A streetcar named desire lives inside my heart and therefore it beats faster. Last Saturday this Professor asked me "in what language do you write", and I was stuck in my mind. I can't say; I only write.
A streetcar named desire takes all writing to you. (Oh, they all lead to you in the end). Because my writings are the breaths of my heart. But some times they're nothing. It's all true, but not always accurate. It's drama, so I play.
By the way, I don't like plays. But I like your name: like a streetcar, it's named "desire".
19 de jul. de 2016
Ai de mim, que sobrevivo sem o coração no peito
Eu hoje vi uma menina igualzinha a ela, minha Ana querida. Entrei, olhei e vi: lá estava. Eu sabia que não era aquela menina que, nas minhas lembranças, é do sul mas é de São Paulo, mas eu fingia que era. Só para sentir-me mais perto. Olhei o nariz, olhei os olhos e o contorno do rosto. Então, pensei: "e agora? será que ela vai fazer aquela cara?". E fez. Enquanto isso, eu não conseguia piscar, eu não parava nem de olhar, e me dei conta que estava com o coração a bater na palma da mão.
Eu hoje fiz um caderno. E pensei em quantos cadernos na vida eu tenho, e quantas vidas cabem em um caderno, e quantos cadernos serão precisos para escrever a minha vida. Enquanto isso, era invadida pela leveza do desejo, da paixão e desespero, pois meu sonho mais próximo estava prestes a se realizar: confeccionar cadernos. Ah, meu coração, que naquele momento batia fora do peito.
Eu hoje caminhei por um lugar cheio de árvores floridas em tons quentes só que era inverno. Eu olhei para elas mas não olhei muito, sentei, tirei um livro cor-de-rosa de um assunto muito sério que estou lendo e fui deixar o dia passar: e meu coração, batendo fora do peito.
Eu hoje sei que em algum momento do dia você apareceu. E me invadiu da sua maneira, sem pedir licença e se esparramando sobre o meu peito, até tomar conta de mim. Para depois ir embora, mas só depois de me roubar de mim. E, neste momento, eu provavelmente estava dirigindo e passando por algum local que me despertaria a nostalgia, e fico dividida entre ser uma boa motorista fria e atenta, ou uma menina toda sentimental a chorar de saudade. Ah, meu coração, que me habita fora do peito!
Eu hoje cheguei em casa e vi uma coisa linda que aconteceu uma vez. Eu recitei todos os detalhes que estão marcados em mim como poesia da qual não me esquecerei nunca. Eu sorri até me emocionar. Eu corri ficando parada. Eu dei um grito dentro de mim. Ah, para a perfeição daquilo que habito, empresto o meu coração fora do peito.
E, para todas as coisas que me são queridas, para todas as coisas que foram vividas, e desejadas, e amadas, e lembradas e guardadas - para todas elas: ai de mim, que sobrevivo sem o coração no peito!
Eu hoje fiz um caderno. E pensei em quantos cadernos na vida eu tenho, e quantas vidas cabem em um caderno, e quantos cadernos serão precisos para escrever a minha vida. Enquanto isso, era invadida pela leveza do desejo, da paixão e desespero, pois meu sonho mais próximo estava prestes a se realizar: confeccionar cadernos. Ah, meu coração, que naquele momento batia fora do peito.
Eu hoje caminhei por um lugar cheio de árvores floridas em tons quentes só que era inverno. Eu olhei para elas mas não olhei muito, sentei, tirei um livro cor-de-rosa de um assunto muito sério que estou lendo e fui deixar o dia passar: e meu coração, batendo fora do peito.
Eu hoje sei que em algum momento do dia você apareceu. E me invadiu da sua maneira, sem pedir licença e se esparramando sobre o meu peito, até tomar conta de mim. Para depois ir embora, mas só depois de me roubar de mim. E, neste momento, eu provavelmente estava dirigindo e passando por algum local que me despertaria a nostalgia, e fico dividida entre ser uma boa motorista fria e atenta, ou uma menina toda sentimental a chorar de saudade. Ah, meu coração, que me habita fora do peito!
Eu hoje cheguei em casa e vi uma coisa linda que aconteceu uma vez. Eu recitei todos os detalhes que estão marcados em mim como poesia da qual não me esquecerei nunca. Eu sorri até me emocionar. Eu corri ficando parada. Eu dei um grito dentro de mim. Ah, para a perfeição daquilo que habito, empresto o meu coração fora do peito.
E, para todas as coisas que me são queridas, para todas as coisas que foram vividas, e desejadas, e amadas, e lembradas e guardadas - para todas elas: ai de mim, que sobrevivo sem o coração no peito!
17 de jul. de 2016
Em algum lugar estás a esta hora
Acordo com o dia, abro o olho e logo penso: onde será que ele está agora?
No meio da manhã, não penso em nada, porque a manhã é comum a todo mundo: as pessoas fazem a mesma coisa.
Mas, no fim do dia, quando a noite começa a dar o ar da graça, lembro comigo: em algum lugar ele está.
Eu hoje acordei cedo e esperei a hora passar deitada na cama. Levantei e me vesti toda de mim para ir num lugar perto da minha casa escrever crônicas. Eu olhei o relógio e ainda assim errei a hora. E então, ao chegar quando tinha acabado e não poder fazer nada, pensei: o que será que ele faz agora?
_______
Eu entrei no meu carro, muito querido, que me leva em todo lugar. Eu observo as árvores pelo caminho e sinto uma gratidão tão grande quando vejo o bairro todo enfeitado de ipês no inverno do meu mês: era só distração de um pensamento - você. Você: em que lugar estás a esta hora?
Eu hoje andei por muitos caminhos. Subi uma ladeira estreita que um dia eu olhei de longe e com medo e pensei: ali, só subo a pé. Mas no outro dia eu subi de segunda marcha e, hoje, subi de terceira a conversar. Eu hoje estava distraída, e corajosa, e cheia de perdão a mim mesma. Eu andava esperando vendo-o passar - ah, se pelo menos ele estivesse aqui!
E ainda hoje eu andei novamente pelo bairro, depois saí da minha casa e fui viver. Mais tarde, cruzei a cidade e passei perto daquele lugar em que meu amigo um dia ficou: toda vez que passo ali lembro de quando todos eles vieram da França. E você, em que lugar estaria a esta hora em que lembro dele e não de você?
E, por último: vejo um vaso de flor na varanda de um prédio, a rua parece lugar nenhum, entro e saio do cinema, passo em duas livrarias só para não perder o costume, compro um presente para a minha irmã porque meu coração é feito ternura, sinto o cheiro do que é distante, não vejo rostos na multidão, fico com vontade de comer um hambúrguer (todos os dias tenho esta vontade), levo um caderno comigo por precaução, noto as cores do céu, converso com um milhão de gente e ainda me sinto sozinha, vejo imagens de balão que andam aparecendo para mim no Pinterest, experimento um pouco da minha indecisão cotidiana, prendo o cabelo num coque bagunçado, coloco brincos vermelhos e noto que é a segunda vez nesta semana que uso vermelho e isso nunca acontece, leio uns poemas do Ferreira Gular na fila só para fazer umas anotações que mais tarde serão usadas, pergunto o preço de um livro e digo como não gosto de perguntar preço de livro, prometo passar na rua coberta de flores ao voltar para casa mas então já é noite e escuridão, observo como as ruas estão vazias e sinto um leve palpitar no peito, meu pensamento me escapa e vai até você, tomo sorvete e penso que mais tarde tomarei de novo e como isso acontecia mais vezes antigamente, fico de novo indecisa, digo a mim mesma "como os filmes poloneses são bons", me imagino falando uma coisa que li um dia, volto para casa e olho para o Andreas e lembro "nós dois uma vez na viagem pela Polônia" e sorrio e vejo na foto que ele sorri também, ... e agora fiquei com preguiça de escrever o que mais aconteceu no dia, que, das 24 horas, tem você em algum lugar a esta hora.
A esta hora... esta e aquela. E as horas do tempo todo.
No meio da manhã, não penso em nada, porque a manhã é comum a todo mundo: as pessoas fazem a mesma coisa.
Mas, no fim do dia, quando a noite começa a dar o ar da graça, lembro comigo: em algum lugar ele está.
Eu hoje acordei cedo e esperei a hora passar deitada na cama. Levantei e me vesti toda de mim para ir num lugar perto da minha casa escrever crônicas. Eu olhei o relógio e ainda assim errei a hora. E então, ao chegar quando tinha acabado e não poder fazer nada, pensei: o que será que ele faz agora?
_______
Eu entrei no meu carro, muito querido, que me leva em todo lugar. Eu observo as árvores pelo caminho e sinto uma gratidão tão grande quando vejo o bairro todo enfeitado de ipês no inverno do meu mês: era só distração de um pensamento - você. Você: em que lugar estás a esta hora?
Eu hoje andei por muitos caminhos. Subi uma ladeira estreita que um dia eu olhei de longe e com medo e pensei: ali, só subo a pé. Mas no outro dia eu subi de segunda marcha e, hoje, subi de terceira a conversar. Eu hoje estava distraída, e corajosa, e cheia de perdão a mim mesma. Eu andava esperando vendo-o passar - ah, se pelo menos ele estivesse aqui!
E ainda hoje eu andei novamente pelo bairro, depois saí da minha casa e fui viver. Mais tarde, cruzei a cidade e passei perto daquele lugar em que meu amigo um dia ficou: toda vez que passo ali lembro de quando todos eles vieram da França. E você, em que lugar estaria a esta hora em que lembro dele e não de você?
E, por último: vejo um vaso de flor na varanda de um prédio, a rua parece lugar nenhum, entro e saio do cinema, passo em duas livrarias só para não perder o costume, compro um presente para a minha irmã porque meu coração é feito ternura, sinto o cheiro do que é distante, não vejo rostos na multidão, fico com vontade de comer um hambúrguer (todos os dias tenho esta vontade), levo um caderno comigo por precaução, noto as cores do céu, converso com um milhão de gente e ainda me sinto sozinha, vejo imagens de balão que andam aparecendo para mim no Pinterest, experimento um pouco da minha indecisão cotidiana, prendo o cabelo num coque bagunçado, coloco brincos vermelhos e noto que é a segunda vez nesta semana que uso vermelho e isso nunca acontece, leio uns poemas do Ferreira Gular na fila só para fazer umas anotações que mais tarde serão usadas, pergunto o preço de um livro e digo como não gosto de perguntar preço de livro, prometo passar na rua coberta de flores ao voltar para casa mas então já é noite e escuridão, observo como as ruas estão vazias e sinto um leve palpitar no peito, meu pensamento me escapa e vai até você, tomo sorvete e penso que mais tarde tomarei de novo e como isso acontecia mais vezes antigamente, fico de novo indecisa, digo a mim mesma "como os filmes poloneses são bons", me imagino falando uma coisa que li um dia, volto para casa e olho para o Andreas e lembro "nós dois uma vez na viagem pela Polônia" e sorrio e vejo na foto que ele sorri também, ... e agora fiquei com preguiça de escrever o que mais aconteceu no dia, que, das 24 horas, tem você em algum lugar a esta hora.
A esta hora... esta e aquela. E as horas do tempo todo.
14 de jul. de 2016
O futuro já começou
O futuro já começou: começou ontem. Começou naquele momento que você não saberia dizer. Naquele instante que passou despercebido. Começou com um som característico que tocava em lugar nenhum. Começou quando achava que não dava.
O futuro já começou e se parece com as janelas abertas de um casarão. É quando piso em uma rua de calçamento - coisa antiga que ainda existe. É quanto toca no rádio a música gravada quando eu ainda nem havia nascido. O futuro já começou e tem cor e gosto - e dá até para ver.
O futuro começou num dia específico. No momento da hora. Na eternidade do estado das coisas. Começou quando eu nem havia começado. Quando eu não estava pronta e pedi para esperar. Quando saí correndo apressada e esqueci algumas coisas pelo caminho.
O futuro já começou e soa como palavras aos meus ouvidos. Eu pensava que ele seria feito hoje para acontecer amanhã, mas o futuro ganhou lugar, na verdade, anos atrás.
O futuro já se iniciou com um sorriso. Ele veio no dia em que você disse um não, no momento em que aceitou um sim, quando abriu a porta e tornou a fechar porque estava com vontade. Ele se parece com uma criança, mas eu diria que ele se parece com a gente mesmo.
O futuro começou na vida quando você fez as suas escolhas, quando dependurou a roupa no varal, quando folheou o jornal e o fechou abruptamente. Era como colocar o telefone no gancho sem a ligação ter terminado: apenas porque queria, sabe como é?
O futuro já começou e tem a cor que a gente pinta. Parece ter tons pastel. Ouvi falar que tem cheiro doce e é de uma profundidade sem igual. Cabe nele toda a poesia e, por mais intrigante que pareça, pode ser escrito em uma folha de papel.
O futuro já começou ontem: vá vivê-lo neste momento que ele se torna amanhã.
O futuro já começou e se parece com as janelas abertas de um casarão. É quando piso em uma rua de calçamento - coisa antiga que ainda existe. É quanto toca no rádio a música gravada quando eu ainda nem havia nascido. O futuro já começou e tem cor e gosto - e dá até para ver.
O futuro começou num dia específico. No momento da hora. Na eternidade do estado das coisas. Começou quando eu nem havia começado. Quando eu não estava pronta e pedi para esperar. Quando saí correndo apressada e esqueci algumas coisas pelo caminho.
O futuro já começou e soa como palavras aos meus ouvidos. Eu pensava que ele seria feito hoje para acontecer amanhã, mas o futuro ganhou lugar, na verdade, anos atrás.
O futuro já se iniciou com um sorriso. Ele veio no dia em que você disse um não, no momento em que aceitou um sim, quando abriu a porta e tornou a fechar porque estava com vontade. Ele se parece com uma criança, mas eu diria que ele se parece com a gente mesmo.
O futuro começou na vida quando você fez as suas escolhas, quando dependurou a roupa no varal, quando folheou o jornal e o fechou abruptamente. Era como colocar o telefone no gancho sem a ligação ter terminado: apenas porque queria, sabe como é?
O futuro já começou e tem a cor que a gente pinta. Parece ter tons pastel. Ouvi falar que tem cheiro doce e é de uma profundidade sem igual. Cabe nele toda a poesia e, por mais intrigante que pareça, pode ser escrito em uma folha de papel.
O futuro já começou ontem: vá vivê-lo neste momento que ele se torna amanhã.
6 de jul. de 2016
Tomando para mim o que era meu
Um livro de capa azul que te leva para dentro de lugar nenhum. Esse lugar, por toda parte, traduzido em palavras.
Um dia a amanhecer de manhã cedo, permitindo-me espreguiçar-se o dia inteiro.
Os detalhes do meu bem que nunca te farão mau. Todos os detalhes do mundo inteiro anoto num caderno depois de ver com os olhos. Isso, é para guardar no coração.
Eu, que vim primeiro. E desbravei todo o território de ser. Fui sendo eu até quando deixei de ser minha, deixei de ser única e passei a dividir amor de pai e de mãe.
Penso que essa mania de ser indecisa é riqueza de ser humano. É quando a pessoa tem tanta alternativa simples na vida que torna complexo a questão de escolher. Deve haver de tudo um muito em uma pessoa que vê 8 lados de uma coisa, porque dizem que tudo tem 2 lados, e ainda há gente que só vê um.
Se um dia você pegou um autógrafo, obrigada pelo favor que me fez. O meu lugar, você não pega de jeito nenhum. Nem aqui, nem aí, do outro lado do mundo mais ao norte onde as calotas polares, neste momento, degelam. O meu lugar você não toma de jeito nenhum.
Um dia eu era filha única, porque sou única todinha. E, depois de um dia, chegou uma pessoa que se envergonhou de não o ser: é que eu já existia. Sinto muito, havia nascido.
Escolhi estudar um negócio que eu nem sei muito bem o que significava. Fui estudando, mas fui mais era lendo. Porque estudar para mim é ler, e ler é estudar. E aí eu fui para a aula e levei um caderno, desci e subi as escadas que ligavam os andares, virei as tardes na biblioteca para não dormir na hora errada. Um dia chegou alguém e quis fazer tudo igualzinho - mas eu já fazia. E essa pessoa nem podia ser autêntica, porque as pessoas autênticas são aquelas que vão primeiro, são primeiro, desbravam primeiro - embora fiquem por último. Mas a contagem do relógio da vida é outro, e não há fuso horário. Nem onde há calotas de gelo, nem onde há calotas de gelo...
Enquanto isso, leio-te todinha, pisco os olhos para disfarçar o que não consigo, desenvolvo um estudo do seu ser e te eternizo em uma revista literária de psicopatia.
O mau do malando é achar que nem todo mundo é esperto.
Um dia a amanhecer de manhã cedo, permitindo-me espreguiçar-se o dia inteiro.
Os detalhes do meu bem que nunca te farão mau. Todos os detalhes do mundo inteiro anoto num caderno depois de ver com os olhos. Isso, é para guardar no coração.
Eu, que vim primeiro. E desbravei todo o território de ser. Fui sendo eu até quando deixei de ser minha, deixei de ser única e passei a dividir amor de pai e de mãe.
Penso que essa mania de ser indecisa é riqueza de ser humano. É quando a pessoa tem tanta alternativa simples na vida que torna complexo a questão de escolher. Deve haver de tudo um muito em uma pessoa que vê 8 lados de uma coisa, porque dizem que tudo tem 2 lados, e ainda há gente que só vê um.
Se um dia você pegou um autógrafo, obrigada pelo favor que me fez. O meu lugar, você não pega de jeito nenhum. Nem aqui, nem aí, do outro lado do mundo mais ao norte onde as calotas polares, neste momento, degelam. O meu lugar você não toma de jeito nenhum.
Um dia eu era filha única, porque sou única todinha. E, depois de um dia, chegou uma pessoa que se envergonhou de não o ser: é que eu já existia. Sinto muito, havia nascido.
Escolhi estudar um negócio que eu nem sei muito bem o que significava. Fui estudando, mas fui mais era lendo. Porque estudar para mim é ler, e ler é estudar. E aí eu fui para a aula e levei um caderno, desci e subi as escadas que ligavam os andares, virei as tardes na biblioteca para não dormir na hora errada. Um dia chegou alguém e quis fazer tudo igualzinho - mas eu já fazia. E essa pessoa nem podia ser autêntica, porque as pessoas autênticas são aquelas que vão primeiro, são primeiro, desbravam primeiro - embora fiquem por último. Mas a contagem do relógio da vida é outro, e não há fuso horário. Nem onde há calotas de gelo, nem onde há calotas de gelo...
Enquanto isso, leio-te todinha, pisco os olhos para disfarçar o que não consigo, desenvolvo um estudo do seu ser e te eternizo em uma revista literária de psicopatia.
O mau do malando é achar que nem todo mundo é esperto.
4 de jul. de 2016
Apressa-te, amor
Quando olhamos para frente, com a certeza de saber nada, nos sentimos tão velhos. Mas quando olhamos para trás, ah, nos sentimos tão jovens. Parece que o dia começou ontem e só há pouco começou a clarear. A aurora que chega no fim do dia - mais precisamente, 18h - não tardará a se apressar, mas mas só para se estender devagarinho.
Será que, assim que o tempo passa, as ruas calçadas são trocadas? É que eu pisei nesta rua e queria deixar aqui sempre um passo meu. Vai que alguém se encontra perdido por aqui um dia...
Enquanto isso, apressa-te amor, apressa-te que amanhã eu morro! Vira o rosto e olha de volta para mim, que ando atrás de você. Desce os degraus como quem nunca aprendeu a andar. Mas apressa-te, amor.
Compra um leite para mim na padaria. Compra, porque leite é a minha bebida favorita. Guarda a caixa com carinho - se te ocupa lugar no coração, não há porque se ausentar de casa. Diz-se que na vida há lugar para tudo, mas o que mais ocupa espaço são as memórias das coisas vividas.
Lembra-se do dia que eu te escrevi um detalhe? Lembra de como te atentei para ele? E quando, mais vivida da vida, te segurei a mão? E te recebi num espaço e te dividi meus pais que eram até então só meus? E quando te dei as minhas roupas, porque você finalmente cabia nelas? E ainda li o que você escreveu - logo eu, eu não leio quase nada que as pessoas escrevem, porque estou sempre lendo os grandes escritores. Apressa-te, amor.
Apressa-te amor, chama o número de onde estou. São tantos números mas lembra que um deles é meu favorito. Dá um passo e entra no avião. Manda uma carta e eu vou te vendo. Prometo que não faço barulho, nem com meus olhos eu vejo, e ainda cuido do teu gato. Por isso, apressa-te, amor.
Apressa-te, meu outro amor. Inicia a letra escrita. Acaba, assinando o meu nome. Já sei qual nome é o seu. Ele está em todo o lugar e para ele tenho três pronúncias: como quer que eu te chame?
Apressa-te, amor, olha fundo nos meus olhos para nunca esquecer de qual cor eram. Pega e sente o meu cabelo, que é macio e tem cheiro de mim. Faz nascer em mim poesia que eu te escrevo - a ti me escrevo todinha.
Repara bem nas minhas mãos, como andam perdidas. Não saem de mim, mas não me levam a lugar nenhum. Eu hoje olhei para o lado e vi seus olhos e abri um sorriso todo meu. Por isso, apressa-te, amor. Apressa-te que aqui ainda são menos horas, e você ganha mais tempo no dia. E você pode ainda se redimir, vivendo tudo o que teria vivido e não viveu - e nem me permitiu. Apressa-te, amor, anda rápido com ternura, estende os braços que irei lhe abraçar, faz um chamego ao pé do meu ouvido, fala uma palavra com um sotaque só-somente seu! Apressa-te amor, que eu não te esqueço.
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro, que amanhã eu morro e não te vejo!
Será que, assim que o tempo passa, as ruas calçadas são trocadas? É que eu pisei nesta rua e queria deixar aqui sempre um passo meu. Vai que alguém se encontra perdido por aqui um dia...
Enquanto isso, apressa-te amor, apressa-te que amanhã eu morro! Vira o rosto e olha de volta para mim, que ando atrás de você. Desce os degraus como quem nunca aprendeu a andar. Mas apressa-te, amor.
Compra um leite para mim na padaria. Compra, porque leite é a minha bebida favorita. Guarda a caixa com carinho - se te ocupa lugar no coração, não há porque se ausentar de casa. Diz-se que na vida há lugar para tudo, mas o que mais ocupa espaço são as memórias das coisas vividas.
Lembra-se do dia que eu te escrevi um detalhe? Lembra de como te atentei para ele? E quando, mais vivida da vida, te segurei a mão? E te recebi num espaço e te dividi meus pais que eram até então só meus? E quando te dei as minhas roupas, porque você finalmente cabia nelas? E ainda li o que você escreveu - logo eu, eu não leio quase nada que as pessoas escrevem, porque estou sempre lendo os grandes escritores. Apressa-te, amor.
Apressa-te amor, chama o número de onde estou. São tantos números mas lembra que um deles é meu favorito. Dá um passo e entra no avião. Manda uma carta e eu vou te vendo. Prometo que não faço barulho, nem com meus olhos eu vejo, e ainda cuido do teu gato. Por isso, apressa-te, amor.
Apressa-te, meu outro amor. Inicia a letra escrita. Acaba, assinando o meu nome. Já sei qual nome é o seu. Ele está em todo o lugar e para ele tenho três pronúncias: como quer que eu te chame?
Apressa-te, amor, olha fundo nos meus olhos para nunca esquecer de qual cor eram. Pega e sente o meu cabelo, que é macio e tem cheiro de mim. Faz nascer em mim poesia que eu te escrevo - a ti me escrevo todinha.
Repara bem nas minhas mãos, como andam perdidas. Não saem de mim, mas não me levam a lugar nenhum. Eu hoje olhei para o lado e vi seus olhos e abri um sorriso todo meu. Por isso, apressa-te, amor. Apressa-te que aqui ainda são menos horas, e você ganha mais tempo no dia. E você pode ainda se redimir, vivendo tudo o que teria vivido e não viveu - e nem me permitiu. Apressa-te, amor, anda rápido com ternura, estende os braços que irei lhe abraçar, faz um chamego ao pé do meu ouvido, fala uma palavra com um sotaque só-somente seu! Apressa-te amor, que eu não te esqueço.
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro, que amanhã eu morro e não te vejo!
30 de jun. de 2016
Onde nunca é noite e nunca madrugada
Este momento nunca é noite e nunca madrugada: é entardecer por fora, é amanhecer por dentro.
Mas nao se engane: amo a noite e tenho preguiça do dia. É que de dia todos estao sendo todos, e todas as coisas sao todas as coisas, e as pessoas andam sempre acordadas quando poderiam estar dormindo. De dia, todo mundo faz o que tem que fazer: é de noite que se vive o que se pode ser.
Aqui, neste momento desta época do ano, o sol caiu e não se pôs. Ficou ali escondido, como quem olha ressabiado, pedindo permissão para sair e ouvir um "não!". Fica aí, sol, que todo este tempo nesta época do ano é todo meu.
Um dia eu acordei como acordo todo dia mas não era noite - nem era tarde, nem era dia. Era apenas o entardecer de uma nova contagem no relógio: conto em meus dedos quais dias choveram, quais dias ventaram, quais temperaturas fizeram, em quais horários escureceu mais cedo. Conto os dias contados, conto todos em minhas mãos. Conto as vezes em que no cinema estiveram os filmes bonitos e conto quantas vezes eu saí de casa e fui ver; conto quantos olhares troquei com amores interessantes; conto quantas vezes o céu ficou rosa e a lua apareceu mais, dando-me o ar da graça; conto cada banho delicioso que tomei e penso "será que todo mundo toma banho também em todo lugar do mundo", e já me respondo "ah, não". Mas não tem problema. Eu uma vez gostei de uma pessoa que não tomava banho, e até para ele não tomar banho eu pedia, só para ficar com mais do cheiro dele para mim.
Onde nunca é de noite e nunca madrugada passou rápido porque poderia durar. Mas também passou tão devagar-devagarzinho! Eu vivi cada dia dele e eu fui eu mesma até o fim, até me cansar de mim e me ser toda-todinha de novo novamente.
Lembro como as pessoas são mais bonitas onde nunca é de noite e nunca madrugada, e como sabem até se vestir. Eu coloquei meu lenço que carrego com as mãos e o coração no pescoço e me fui: me fui por aí, onde nunca é de noite e nunca de madrugada porque é sempre entardecer, quando a gente sente que viveu o dia.
Ele hoje se enrola nas cobertas - bem naquela coberta gostosa que minha avó comprou para ela mas me deu, sobre a qual eu liguei para agradecer muitas vezes, tamanho o amor que estou pela minha coberta em minhas noites - deita no meu ombro e sente o meu cheiro, que vai levar consigo durante os próximos meses que atravessar e tiver que percorrer.
Leva um pedaço meu consigo, leva que é para você se lembrar de fazer todo dia como nunca de noite e nunca de madrugada.
Mas nao se engane: amo a noite e tenho preguiça do dia. É que de dia todos estao sendo todos, e todas as coisas sao todas as coisas, e as pessoas andam sempre acordadas quando poderiam estar dormindo. De dia, todo mundo faz o que tem que fazer: é de noite que se vive o que se pode ser.
Aqui, neste momento desta época do ano, o sol caiu e não se pôs. Ficou ali escondido, como quem olha ressabiado, pedindo permissão para sair e ouvir um "não!". Fica aí, sol, que todo este tempo nesta época do ano é todo meu.
Um dia eu acordei como acordo todo dia mas não era noite - nem era tarde, nem era dia. Era apenas o entardecer de uma nova contagem no relógio: conto em meus dedos quais dias choveram, quais dias ventaram, quais temperaturas fizeram, em quais horários escureceu mais cedo. Conto os dias contados, conto todos em minhas mãos. Conto as vezes em que no cinema estiveram os filmes bonitos e conto quantas vezes eu saí de casa e fui ver; conto quantos olhares troquei com amores interessantes; conto quantas vezes o céu ficou rosa e a lua apareceu mais, dando-me o ar da graça; conto cada banho delicioso que tomei e penso "será que todo mundo toma banho também em todo lugar do mundo", e já me respondo "ah, não". Mas não tem problema. Eu uma vez gostei de uma pessoa que não tomava banho, e até para ele não tomar banho eu pedia, só para ficar com mais do cheiro dele para mim.
Onde nunca é de noite e nunca madrugada passou rápido porque poderia durar. Mas também passou tão devagar-devagarzinho! Eu vivi cada dia dele e eu fui eu mesma até o fim, até me cansar de mim e me ser toda-todinha de novo novamente.
Lembro como as pessoas são mais bonitas onde nunca é de noite e nunca madrugada, e como sabem até se vestir. Eu coloquei meu lenço que carrego com as mãos e o coração no pescoço e me fui: me fui por aí, onde nunca é de noite e nunca de madrugada porque é sempre entardecer, quando a gente sente que viveu o dia.
Ele hoje se enrola nas cobertas - bem naquela coberta gostosa que minha avó comprou para ela mas me deu, sobre a qual eu liguei para agradecer muitas vezes, tamanho o amor que estou pela minha coberta em minhas noites - deita no meu ombro e sente o meu cheiro, que vai levar consigo durante os próximos meses que atravessar e tiver que percorrer.
Leva um pedaço meu consigo, leva que é para você se lembrar de fazer todo dia como nunca de noite e nunca de madrugada.
29 de jun. de 2016
Assim estava escrito
O mundo estava escrito no dia em que ganhou forma.
E tudo, desde então, tem estado ou sido escrito. O que não foi, vai ser ainda. E tudo não será mais do que palavras. Que serão tudo. Porque palavras dão significados para os nomes e números. Tudo é feito de palavras, não está lendo?
Um dia alguém pegou uma caneta, que naquela época era apenas chamada "tinta" ou algo assim, e escreveu em uma folha de papel. Sim, porque antes de se desenhar, tem-se que estar planejado. E pensamentos não são mais do que palavras a ganhar forma.
Pois assim estava escrito.
O que ela iria ser nem ela sabia, mas estava escrito. Todas as coisas do mundo, antes de serem, já estavam escritas - quero deixar claro que não estou falando de destino muito menos de profecias: estou falando de escrita, de traços, de linhas.
E, porque tudo estaria escrito, acabou-se o medo. E não morreu a esperança: nasceu o leve suspirar por esperar pelo que traz o amanhã.
Assim estava escrito era a desculpa para a procrastinação da moça com dois braços e duas pernas, e o estoque das coisas bem-quistas, e o deboche interior uma vez ou outra, e até o modo como ela prenderia o cabelo. Era também os olhares que ela dava e guardava para si, pois era tímida e não queria que eles soubessem que os estava vendo - digo, admirando - e o jeito metódico com que analisava o modo como as pessoas escreviam: só depois lia o que queriam dizer.
E até o que não estava escrito assim o era porque estava escrito, porque tudo o que foi imaginado será um dia vivido. Enquanto isso, escrevamos o presente, que é futuro até ser colocado em palavras, que tomam conta de um papel a garantir que o passado existiu.
Assim é, porque assim estava escrito.
E tudo, desde então, tem estado ou sido escrito. O que não foi, vai ser ainda. E tudo não será mais do que palavras. Que serão tudo. Porque palavras dão significados para os nomes e números. Tudo é feito de palavras, não está lendo?
Um dia alguém pegou uma caneta, que naquela época era apenas chamada "tinta" ou algo assim, e escreveu em uma folha de papel. Sim, porque antes de se desenhar, tem-se que estar planejado. E pensamentos não são mais do que palavras a ganhar forma.
Pois assim estava escrito.
O que ela iria ser nem ela sabia, mas estava escrito. Todas as coisas do mundo, antes de serem, já estavam escritas - quero deixar claro que não estou falando de destino muito menos de profecias: estou falando de escrita, de traços, de linhas.
E, porque tudo estaria escrito, acabou-se o medo. E não morreu a esperança: nasceu o leve suspirar por esperar pelo que traz o amanhã.
Assim estava escrito era a desculpa para a procrastinação da moça com dois braços e duas pernas, e o estoque das coisas bem-quistas, e o deboche interior uma vez ou outra, e até o modo como ela prenderia o cabelo. Era também os olhares que ela dava e guardava para si, pois era tímida e não queria que eles soubessem que os estava vendo - digo, admirando - e o jeito metódico com que analisava o modo como as pessoas escreviam: só depois lia o que queriam dizer.
E até o que não estava escrito assim o era porque estava escrito, porque tudo o que foi imaginado será um dia vivido. Enquanto isso, escrevamos o presente, que é futuro até ser colocado em palavras, que tomam conta de um papel a garantir que o passado existiu.
Assim é, porque assim estava escrito.
26 de jun. de 2016
E o sorriso que eu te levava desprendeu-se e caiu de mim
Mas não se engane: ainda há sorriso.
Mas o sorriso, que era seu em mim, materializado em minha boca como resultado de algo em você, se desprendeu. Caiu de mim.
Hoje os meus olhos veem até tons de azul diferente - eu nunca liguei para tons de azul, eu gostava apenas da cor em si. (sim, isto é uma metáfora)
Hoje o sorriso que eu te levava, se existe, está dormindo. Está colocando as meias no sapato. Está se preparando para deitar.
Porque, hoje, o sorriso que eu te levava volta a ser meu. Ele, que sempre morou em mim. Nasceu comigo no dia em que eu vi ao mundo e, ainda assim, chorei. É que a gente chora ao nascer com saudade da mãe da gente, mas logo se acostuma com o mundo.
Hoje os meus olhos voltam a ser meus, e eu olho para quem eu quiser. E vejo-os olhando para mim - sim, eles. Minhas mãos dão rumo aos dias, como a marcha que passo ao dirigir meu carro. Elas não mais estão a esperar pelo seu toque, porque não te alcançam e nem se importam. E os meus braços, que são os meus dois lados, também não se lembram de um toque seu.
Hoje, o sorriso que eu te levava desprendeu-se e caiu de mim. Nem parei para pegá-lo: tomei rumo e segui.
Sorri para ela e para ele, que são meus amigos feitos pelo caminho que um dia a vida me deu. Levo-os sempre comigo, no meu coração e em meus escritos, porque me permitem. São e estão presentes. Ah, que saudade eu sinto dos que me são queridos - sinto o tempo inteiro! Eu já acabo de os escrever e estou com saudades. Ela, que mora em um lugar que está apenas 1 hora de antecedência de mim mas há milhares de quilômetros de distância - como pode um lugar tão longe pelo tempo parecer tão perto?
E você, que está a 5 horas de distância de mim? Está mais longe ou mais perto? E estou contando isso de acordo com o relógio regulado pelo horário de verão? Quando é o horário de inverno, todo o outro tempo? Pego-me envolvida com estas burocracias e me dou conta: o sorriso que eu te levava desprendeu-se - caso contrário, eu estaria escrevendo-te poesia.
Hoje, meu sorriso volta a ser meu e para as pessoas que me se fazem queridas.
P.S.: You don't own my smile. You don't even have it anymore. But I'm still nice. Because I am nice. Don't get me wrong ;)
Mas o sorriso, que era seu em mim, materializado em minha boca como resultado de algo em você, se desprendeu. Caiu de mim.
Hoje os meus olhos veem até tons de azul diferente - eu nunca liguei para tons de azul, eu gostava apenas da cor em si. (sim, isto é uma metáfora)
Hoje o sorriso que eu te levava, se existe, está dormindo. Está colocando as meias no sapato. Está se preparando para deitar.
Porque, hoje, o sorriso que eu te levava volta a ser meu. Ele, que sempre morou em mim. Nasceu comigo no dia em que eu vi ao mundo e, ainda assim, chorei. É que a gente chora ao nascer com saudade da mãe da gente, mas logo se acostuma com o mundo.
Hoje os meus olhos voltam a ser meus, e eu olho para quem eu quiser. E vejo-os olhando para mim - sim, eles. Minhas mãos dão rumo aos dias, como a marcha que passo ao dirigir meu carro. Elas não mais estão a esperar pelo seu toque, porque não te alcançam e nem se importam. E os meus braços, que são os meus dois lados, também não se lembram de um toque seu.
Hoje, o sorriso que eu te levava desprendeu-se e caiu de mim. Nem parei para pegá-lo: tomei rumo e segui.
Sorri para ela e para ele, que são meus amigos feitos pelo caminho que um dia a vida me deu. Levo-os sempre comigo, no meu coração e em meus escritos, porque me permitem. São e estão presentes. Ah, que saudade eu sinto dos que me são queridos - sinto o tempo inteiro! Eu já acabo de os escrever e estou com saudades. Ela, que mora em um lugar que está apenas 1 hora de antecedência de mim mas há milhares de quilômetros de distância - como pode um lugar tão longe pelo tempo parecer tão perto?
E você, que está a 5 horas de distância de mim? Está mais longe ou mais perto? E estou contando isso de acordo com o relógio regulado pelo horário de verão? Quando é o horário de inverno, todo o outro tempo? Pego-me envolvida com estas burocracias e me dou conta: o sorriso que eu te levava desprendeu-se - caso contrário, eu estaria escrevendo-te poesia.
Hoje, meu sorriso volta a ser meu e para as pessoas que me se fazem queridas.
P.S.: You don't own my smile. You don't even have it anymore. But I'm still nice. Because I am nice. Don't get me wrong ;)
23 de jun. de 2016
Lembrar-se do que não existiu
Todos os sonos em que lhe tenho no sonho me são cansativos. Acordo como quem nem dormiu. Abro a janela para ver a luz do dia e não vejo nada.
Era uma vez uma menina - no caso, eu - e algumas cidades, e alguns tempos que aqui prefiro contar os minutos, e uns lugares, e lembranças, e letras escritas mas nunca lidas, e o lugar do lado de fora. Era uma vez tudo isso porque não foi nada. É por isso que eu lembro do que não existiu.
O que não existiu levo comigo. Vez ou outra, paro, encaro-o nos olhos e penso: precisa sair do mundo das ideias de Platão para ganhar lugar, ou só de nascer já é? Não sei, mas levo comigo enquanto caminho.
Um dia eu deitei a cabeça no travesseiro e dormi culpada e acordei mártir. Eu fui a menina inocente que estava apenas fazendo o seu melhor - ainda que não o suficiente (espera, quem foi que disse?). E levantei da cama e fui viver meus dias que ainda restavam. Mas então, no meio da tarde, eu era lembrada do que não existiu: como isso era possível?
E você, porque não me deixa olhar os seus olhos? O motivo tem um nome, me diga qual é.
Era uma vez uma outra pessoa, desta vez um menino, e as ligações não feitas, e acordos implícitos não cumpridos, e tentativas que nem nasceram, e um monte de coisas dentro de si. Havia também a relutância em visitar um local ou outro que tivesse qualquer lembrança dela (eu, a menina), e os olhos voltados para baixo, como que fechados, para eu nunca mais ver a sua cor: como se eu precisasse ver de novo para saber, ha.
Um menino na vida e as trilhas percorridas, e os trens que cruzam países, e a passagem ridiculamente barata, e uns trocados jogados no fundo da mochila, e um cachecol enrolado no pescoço que lhe permite ir aonde se quer ir, e um pedaço de papel que não foi escrito, e uma boca calada de palavras não ditas, e um muito obrigado, e o meu muito obrigada, e umas lembranças que faríamos mas deixamos por fazer, e todos os outros amigos que ganharam lugar em sua vida e o prazer de sua companhia, e o tempo perdido, e o tempo vivido, e o tempo que hia de vir mas não veio - e minha gastura com os verbos no português, porque não sei me expressar direito e nem sei se este verbo, "hia", existe e, ao procurar, só achei uns escritos em latim - , e eu a menina porque sem eu não haveria a sua história, e a relutância em me ver como se para isso doesse os olhos.
De tudo isso, eu apenas queria dizer, com os ombros encolhidos e o coração em dor que se manifesta acima do peito e abaixo da garganta, que me lembro do que não existiu. Que me fazem visitas os pensamentos que estão atrás da mente mas que não coloco em palavras que virariam frases e expressariam o que estou sentindo. Que há os dias que não vieram e, por isso, não se foram. Que há a imagem de uma velha na esquina de uma padaria a comprar pão em uma cidade do fim do mundo em que fui habitar sozinha - tão valente que sou - e há os dizeres imperfeitos.
E eu queria expressar de alguma maneira que sempre sou invadida pela ausência de você, como se você estivesse aqui. E é sempre a mesma coisa: você tem que ir, pois o avião já parte; você mora em uma rua paralela a minha, mas não na minha casa; muitos conversam contigo a te olhar nos olhos, mas eu sequer consigo lhe escrever; chego no fim do sonho e encontro um lugar vazio, pois você foi embora e não me deu sequer a proper tchau. E porque fico ali, no fim da rua, a lembrar-se do que não existiu. E, dolorida, acordo para o novo dia.
Por fim, quero dizer que isto acontece nos sonhos que me invadem o sono da madrugada ou do dia (é que na noite estou acordada). E estou contando aqui o mais íntimo do meu ser, a me revelar todinha. Olha, eu sou muito sincera e honesta, mas há vezes em que doo-me toda para você me ler.
Era uma vez uma menina - no caso, eu - e algumas cidades, e alguns tempos que aqui prefiro contar os minutos, e uns lugares, e lembranças, e letras escritas mas nunca lidas, e o lugar do lado de fora. Era uma vez tudo isso porque não foi nada. É por isso que eu lembro do que não existiu.
O que não existiu levo comigo. Vez ou outra, paro, encaro-o nos olhos e penso: precisa sair do mundo das ideias de Platão para ganhar lugar, ou só de nascer já é? Não sei, mas levo comigo enquanto caminho.
Um dia eu deitei a cabeça no travesseiro e dormi culpada e acordei mártir. Eu fui a menina inocente que estava apenas fazendo o seu melhor - ainda que não o suficiente (espera, quem foi que disse?). E levantei da cama e fui viver meus dias que ainda restavam. Mas então, no meio da tarde, eu era lembrada do que não existiu: como isso era possível?
E você, porque não me deixa olhar os seus olhos? O motivo tem um nome, me diga qual é.
Era uma vez uma outra pessoa, desta vez um menino, e as ligações não feitas, e acordos implícitos não cumpridos, e tentativas que nem nasceram, e um monte de coisas dentro de si. Havia também a relutância em visitar um local ou outro que tivesse qualquer lembrança dela (eu, a menina), e os olhos voltados para baixo, como que fechados, para eu nunca mais ver a sua cor: como se eu precisasse ver de novo para saber, ha.
Um menino na vida e as trilhas percorridas, e os trens que cruzam países, e a passagem ridiculamente barata, e uns trocados jogados no fundo da mochila, e um cachecol enrolado no pescoço que lhe permite ir aonde se quer ir, e um pedaço de papel que não foi escrito, e uma boca calada de palavras não ditas, e um muito obrigado, e o meu muito obrigada, e umas lembranças que faríamos mas deixamos por fazer, e todos os outros amigos que ganharam lugar em sua vida e o prazer de sua companhia, e o tempo perdido, e o tempo vivido, e o tempo que hia de vir mas não veio - e minha gastura com os verbos no português, porque não sei me expressar direito e nem sei se este verbo, "hia", existe e, ao procurar, só achei uns escritos em latim - , e eu a menina porque sem eu não haveria a sua história, e a relutância em me ver como se para isso doesse os olhos.
De tudo isso, eu apenas queria dizer, com os ombros encolhidos e o coração em dor que se manifesta acima do peito e abaixo da garganta, que me lembro do que não existiu. Que me fazem visitas os pensamentos que estão atrás da mente mas que não coloco em palavras que virariam frases e expressariam o que estou sentindo. Que há os dias que não vieram e, por isso, não se foram. Que há a imagem de uma velha na esquina de uma padaria a comprar pão em uma cidade do fim do mundo em que fui habitar sozinha - tão valente que sou - e há os dizeres imperfeitos.
E eu queria expressar de alguma maneira que sempre sou invadida pela ausência de você, como se você estivesse aqui. E é sempre a mesma coisa: você tem que ir, pois o avião já parte; você mora em uma rua paralela a minha, mas não na minha casa; muitos conversam contigo a te olhar nos olhos, mas eu sequer consigo lhe escrever; chego no fim do sonho e encontro um lugar vazio, pois você foi embora e não me deu sequer a proper tchau. E porque fico ali, no fim da rua, a lembrar-se do que não existiu. E, dolorida, acordo para o novo dia.
Por fim, quero dizer que isto acontece nos sonhos que me invadem o sono da madrugada ou do dia (é que na noite estou acordada). E estou contando aqui o mais íntimo do meu ser, a me revelar todinha. Olha, eu sou muito sincera e honesta, mas há vezes em que doo-me toda para você me ler.
16 de jun. de 2016
Duas ou três coisas que sei dela
(De todo os segundos que passamos juntos, aprendi os detalhes da menina que ela é. Ela foi se mostrando aos poucos e, quando vi, já tinha tomado conta: tinha se esparramado no sofá, tirado o seu tênis branco sujo das cores da rua e esticado as pernas até encostar seus dedos do pé nos meus)
Eu, quando sou invadido pela lembrança de você, penso em duas ou três coisas:
Sei que você tinha o olhar contido e já me olhava sem olhar para mim. Sei que reparou quando eu passei pelo corredor e você conseguiu me ver pelo vidro e, desde então, sei que você me olhou com os mais profundos olhos castanhos que eu já vi na vida, e que me olhava sem parar e sem piscar os olhos, porque, como diria você: "hey, handsome: you're the most beautiful thing. Ever."
Sei que você me escreveu nas horas em que o sol e a lua se alinhavam no céu: pôs no papel todo sentimento e pensamento e pedaço de você. Falava sobre mim, mas acabava por revelar-se. Me escreveu as mais doces e tenras cartas, e cartões escondidos pelos cantos, pelas malas, pelas pilhas de roupas, pela vida, que eram para ser achados de surpresa. Sei que deve haver mais cartões e cartas suas pelas esquinas da vida, e eu espero poder encontrar. Você, que sempre me escreveu tão doce, e tão difícil, e tão verdadeiramente, e tão explícito, e tão longe, e tão quente, e tão carinhosamente de um jeito só seu para mim.
Sei que seus braços eram fortes e fracos mas firmes envoltos em mim. E que poderia para sempre se esconder no meu abraço. E que me abraçaria como se eu fosse a coisa mais preciosa na sua vida. E me envolveria no calor deles, chamando-me de frio, quando era eu quem a esquentava, oras. Mas, apesar de tudo, seus braços eram leves e, quando soltei-me deles, você me deixou ir - isso, porque eu já havia deixado-a ir embora primeiro. Como pude eu? Eu, um homem com suas escolhas, e você, uma mulher refém do que eu decidi para mim e que afetaria nós dois.
(E sigo os dias e caminhos que o mundo tem para mim e vejo lá na frente. Caminho e sigo e tenho o olhar fixo, por isso não a vejo, ela. Mas, se a vida me perguntar, tenho duas ou três coisas que sei dela, pois a levo atrás do pensamento).
15 de jun. de 2016
Eu era o que sou mesmo
Esqueci de escrever: eu era o que sou mesmo.
Foi-se mas não perdeu-se. Ficou e se manteve. Se redescobriu sem deixar de ser. O que ela era, sempre existira. Bastava apenas olhar de novo, com os olhos fixos, a piscar devagar.
Um dia, andando pelas ruas da vida que eram cercadas por bosques, vi-me em mim e me disse: sou.
E eu, que sou-me, serei-me. Hei de ser, não há escapatória para a delícia de ser quem se é.
Quando eu fui feita, me deram as minhas mãos para eu escrever no papel; os meus olhos para eu ver e nunca mais esquecer; meus pés para eu dar os passos que eu quiser; bochechas gordas para dizer que sou filha da minha mãe; o resto dos detalhes do rosto para dizer que sou filha do meu pai; um cérebro para brigar comigo; e meu coração, onde moro. E todo o resto que sou eu.
Eu fui feita numa noite, não duvido. E nasci na madrugada do meu dia. Era quase de manhã, porque a noite havia há pouco dormido. Era ainda o dia mais frio dos dias frios de que se tem notícias, e eu pensei que era uma hora boa para chegar.
Desde então sou a minha biografia que vivo enquanto escrevo e que escrevo na medida da minha vida. Sou raios de sol fracos por trás das nuvens e o rajar forte do vento. Sou uma coisa escondida na esquina da rua das casas com números pares, e sou destra apenas para ser diferente de tudo mais que fosse haver aqui em casa. E sou também os dias que vivi, e até os que tive preguiça de acontecer. Sou o bom dia não dado, essa mania de me ser sempre sincera, a doçura de se permitir.
Um dia eu me dividi contigo, e eu fui metade de mim. Há a outra parte que guardo comigo, e levo sorrindo, para o futuro a chegar para ele, irei inteira.
E, enquanto vou-me sendo, pego os pedaços de mim que me são comigo, e as lembranças que lhe são contigo, e vou indo: eu era o que sou mesmo - pois sou.
Foi-se mas não perdeu-se. Ficou e se manteve. Se redescobriu sem deixar de ser. O que ela era, sempre existira. Bastava apenas olhar de novo, com os olhos fixos, a piscar devagar.
Um dia, andando pelas ruas da vida que eram cercadas por bosques, vi-me em mim e me disse: sou.
E eu, que sou-me, serei-me. Hei de ser, não há escapatória para a delícia de ser quem se é.
Quando eu fui feita, me deram as minhas mãos para eu escrever no papel; os meus olhos para eu ver e nunca mais esquecer; meus pés para eu dar os passos que eu quiser; bochechas gordas para dizer que sou filha da minha mãe; o resto dos detalhes do rosto para dizer que sou filha do meu pai; um cérebro para brigar comigo; e meu coração, onde moro. E todo o resto que sou eu.
Eu fui feita numa noite, não duvido. E nasci na madrugada do meu dia. Era quase de manhã, porque a noite havia há pouco dormido. Era ainda o dia mais frio dos dias frios de que se tem notícias, e eu pensei que era uma hora boa para chegar.
Desde então sou a minha biografia que vivo enquanto escrevo e que escrevo na medida da minha vida. Sou raios de sol fracos por trás das nuvens e o rajar forte do vento. Sou uma coisa escondida na esquina da rua das casas com números pares, e sou destra apenas para ser diferente de tudo mais que fosse haver aqui em casa. E sou também os dias que vivi, e até os que tive preguiça de acontecer. Sou o bom dia não dado, essa mania de me ser sempre sincera, a doçura de se permitir.
Um dia eu me dividi contigo, e eu fui metade de mim. Há a outra parte que guardo comigo, e levo sorrindo, para o futuro a chegar para ele, irei inteira.
E, enquanto vou-me sendo, pego os pedaços de mim que me são comigo, e as lembranças que lhe são contigo, e vou indo: eu era o que sou mesmo - pois sou.
14 de jun. de 2016
De repente, numa madrugada de terça
Esperei muitos dias para contar, esperei até anos. Esperei cada segundo do relógio, sabendo que o tempo passa mas o que aconteceu fica.
Era uma vez uma madrugada de terça, mas, antes disso, houve os outros dias.
Houve um dia na vida em que começou tudo - a vontade de ser. Houve então os outros dias, comuns, como todos os outros. Eram dias em que eu usava o meu all star preto com branco e caminhava pelas ruas do meu bairro com um sopro-suspiro no coração. E fui indo.
Chegou o dia, chegou o tempo e chegou tudo o que deveria ser: mas eu ainda não sabia.
Eu lembro de quando desci do carro, puxando minhas vidas - digo, malas - e olhei para um prédio grande bem ali na minha frente. Ah, se eu sequer tivesse pensado em olhar para o lado! (e nem adiantaria, porque ele ainda não estava lá).
E os dias foram passando conforme mandava o relógio e, num desses dias, eu olhei para trás. Olhei para trás para ver aquela voz que eu ouvia, olhei para trás para ver quem eu já saberia que ia ser, olhei para trás e lembrei do meu futuro ali, olhei para trás e vi.
E, desde o dia em que vi ele, via-o sempre, ainda que com os olhos do coração, e do desejo, e das minhas mãos. Enquanto isso, os dias, poucos, pareciam longos e, demoradamente, iam passando. Fazíamos tudo o que tínhamos que fazer, como colocar macarrão num prato todo dia na hora do almoço. Isso quer dizer que eu estava cansada de comer todo dia a mesma coisa e sentir-parecer que todos os dias eram a mesma coisa mas no fundo todos os dias eram uma surpresa diferente. Ah!
E então começou a semana pela qual eu esperei mas, no entanto, nem esperava.
(antes disso começou outra semana, a semana anterior a ela, que foi quando tudo começou: quando eu comecei, sabe como?)
E, voltando para aquela semana, a que havia começado, lembro-me de estar escrevendo um artigo sobre James Joyce, muito difícil mas incrivelmente apaixonante, embora eu me culpasse por ter escolhido aquele livro e aquele autor entre tantos livros e autores. Fazer o que? A gente sempre segue o coração. Devo mencionar ainda que eu deixei tudo para a última hora, como sempre, e que todo o tempo que tive para escrever foi ignorado e me concentrei em me virar no último momento: nas últimas 48 horas, que é quando as coisas acontecem. Minha inspiração ou vem quando quer ou vem sob pressão, e, no fim, só há esses dois caminhos mesmos.
Já estou me alongando no que eu queria dizer: que, numa madrugada de terça, que é quando deveria ser, o relógio parou e os ponteiros se perderam porque se encontraram e eu vi que o tempo perdido foi tempo ganho e que, assim, eu o perderia sempre para você. Neste momento, poderia, aqui mesmo, reproduzir uma frase em inglês que ilustra tudo isso, que saiu dos seus lábios mas foi digitada pelas suas mãos, e que eu nunca esqueci. Mas vou deixar para um outro momento.
Eu esqueço o geral, mas os detalhes eu sempre lembro.
E foi assim: de repente, numa madrugada de terça. Simplesmente do jeito que eu pedi para ser, sem mais nem menos, em seus mínimos detalhes. Eu escrevo isso porque, se eu contar, ninguém acredita. Teve o dia e teve a hora e teve o segundo e o minutos que não passavam nunca e o tempo parou e eu também parei aquele momento.
E, para mostrar que é verdade, tudo começou no fim da noite, que era ainda segunda-feira, mas o ato só se concretizou mesmo na terça-feira, de madrugada: de repente, numa madrugada de terça.
Eu não acredito em coincidências. Mas elas existem. Eu é que olho para elas ora de um jeito ora de outro e as chamo de outra coisa. Mas, neste caso, eu não acredito em coincidências. Eu pedi e disse. E me foi dado, e eu recebi com todo o meu amor. E meu coração transbordou de si, ficou mais coração aqui dentro, e desde então eu revivo este momento (só de vez em quando, mas ele está sempre lá) e espero por outros momentos como este: de repente, numa madrugada de terça.
Lembra que foi neste dia?
;)
Era uma vez uma madrugada de terça, mas, antes disso, houve os outros dias.
Houve um dia na vida em que começou tudo - a vontade de ser. Houve então os outros dias, comuns, como todos os outros. Eram dias em que eu usava o meu all star preto com branco e caminhava pelas ruas do meu bairro com um sopro-suspiro no coração. E fui indo.
Chegou o dia, chegou o tempo e chegou tudo o que deveria ser: mas eu ainda não sabia.
Eu lembro de quando desci do carro, puxando minhas vidas - digo, malas - e olhei para um prédio grande bem ali na minha frente. Ah, se eu sequer tivesse pensado em olhar para o lado! (e nem adiantaria, porque ele ainda não estava lá).
E os dias foram passando conforme mandava o relógio e, num desses dias, eu olhei para trás. Olhei para trás para ver aquela voz que eu ouvia, olhei para trás para ver quem eu já saberia que ia ser, olhei para trás e lembrei do meu futuro ali, olhei para trás e vi.
E, desde o dia em que vi ele, via-o sempre, ainda que com os olhos do coração, e do desejo, e das minhas mãos. Enquanto isso, os dias, poucos, pareciam longos e, demoradamente, iam passando. Fazíamos tudo o que tínhamos que fazer, como colocar macarrão num prato todo dia na hora do almoço. Isso quer dizer que eu estava cansada de comer todo dia a mesma coisa e sentir-parecer que todos os dias eram a mesma coisa mas no fundo todos os dias eram uma surpresa diferente. Ah!
E então começou a semana pela qual eu esperei mas, no entanto, nem esperava.
(antes disso começou outra semana, a semana anterior a ela, que foi quando tudo começou: quando eu comecei, sabe como?)
E, voltando para aquela semana, a que havia começado, lembro-me de estar escrevendo um artigo sobre James Joyce, muito difícil mas incrivelmente apaixonante, embora eu me culpasse por ter escolhido aquele livro e aquele autor entre tantos livros e autores. Fazer o que? A gente sempre segue o coração. Devo mencionar ainda que eu deixei tudo para a última hora, como sempre, e que todo o tempo que tive para escrever foi ignorado e me concentrei em me virar no último momento: nas últimas 48 horas, que é quando as coisas acontecem. Minha inspiração ou vem quando quer ou vem sob pressão, e, no fim, só há esses dois caminhos mesmos.
Já estou me alongando no que eu queria dizer: que, numa madrugada de terça, que é quando deveria ser, o relógio parou e os ponteiros se perderam porque se encontraram e eu vi que o tempo perdido foi tempo ganho e que, assim, eu o perderia sempre para você. Neste momento, poderia, aqui mesmo, reproduzir uma frase em inglês que ilustra tudo isso, que saiu dos seus lábios mas foi digitada pelas suas mãos, e que eu nunca esqueci. Mas vou deixar para um outro momento.
Eu esqueço o geral, mas os detalhes eu sempre lembro.
E foi assim: de repente, numa madrugada de terça. Simplesmente do jeito que eu pedi para ser, sem mais nem menos, em seus mínimos detalhes. Eu escrevo isso porque, se eu contar, ninguém acredita. Teve o dia e teve a hora e teve o segundo e o minutos que não passavam nunca e o tempo parou e eu também parei aquele momento.
E, para mostrar que é verdade, tudo começou no fim da noite, que era ainda segunda-feira, mas o ato só se concretizou mesmo na terça-feira, de madrugada: de repente, numa madrugada de terça.
Eu não acredito em coincidências. Mas elas existem. Eu é que olho para elas ora de um jeito ora de outro e as chamo de outra coisa. Mas, neste caso, eu não acredito em coincidências. Eu pedi e disse. E me foi dado, e eu recebi com todo o meu amor. E meu coração transbordou de si, ficou mais coração aqui dentro, e desde então eu revivo este momento (só de vez em quando, mas ele está sempre lá) e espero por outros momentos como este: de repente, numa madrugada de terça.
Lembra que foi neste dia?
;)
12 de jun. de 2016
A frente fria que a chuva traz
Eis a frente fria mais fria de todas: a de aquecer meu coração - assim a chuva traz:
meu tempo, só pra mim; um caderno solto com folhas em branco; um sentimento que não se pode nomear e que habita dentro de mim; tentativas de tranças no cabelo, que está curto mas para os outros isso é comprido; o frio gelado a contornar a janela; um homem que escreve e eu prestei atenção nele; começar a comer igual gente de verdade que eu sempre deveria ter sido; o medo alegre de te esperar; as coincidências que moldam o destino; um gato na janela de uma casa na esquina de uma rua que eu parei para fotografar; uma moça ou outra com quem acabei conversando; cheiro de coisa boa no ar do inverno mais denso; as diversas maneiras de se falar uma coisa; o brilho em meus olhos para quem olhar; sentir meu corpo; achar tudo delicioso; subir uma rua íngreme de carro como quem briga com o perigo; adorar tentar; as alternativas que brotam em um canteiro de margarida ao longo da estrada da vida; as portas que levam a lugar nenhum - pensávamos - mas que se abriram para algo em nossa frente; o modo como ele fala e para e pisca e ouve e olha e pega na caneta com a mão esquerda e lê uma carta com ideias que tomaram formas e se tornaram palavras bonitas; eu, parando para respirar; um dia inteiro; comprar tecidos como quem compra possibilidades; olhar para os dedos e ver arte a nascer por meio deles; os desejos; um lugar que estacionei meu carro; lembrar-se com a saudade mais gostosa de todas; olhar para o horizonte e ver poesia; a força do que tem que ser; tornar-se o que se deveria ter sido; ir onde se foi; um lugar na mesa; sorrir genuinamente; deixar ir; respeitar meus sentimentos; abrir a boca e começar a falar canção da década de 70; o sol de inverno que, felizmente, se esconde atrás das nuvens e deixa meus dias mais bonitos; poder andar pelas ruas durante o inverno gélido que me esquenta a alma; o desafio de seguir.
meu tempo, só pra mim; um caderno solto com folhas em branco; um sentimento que não se pode nomear e que habita dentro de mim; tentativas de tranças no cabelo, que está curto mas para os outros isso é comprido; o frio gelado a contornar a janela; um homem que escreve e eu prestei atenção nele; começar a comer igual gente de verdade que eu sempre deveria ter sido; o medo alegre de te esperar; as coincidências que moldam o destino; um gato na janela de uma casa na esquina de uma rua que eu parei para fotografar; uma moça ou outra com quem acabei conversando; cheiro de coisa boa no ar do inverno mais denso; as diversas maneiras de se falar uma coisa; o brilho em meus olhos para quem olhar; sentir meu corpo; achar tudo delicioso; subir uma rua íngreme de carro como quem briga com o perigo; adorar tentar; as alternativas que brotam em um canteiro de margarida ao longo da estrada da vida; as portas que levam a lugar nenhum - pensávamos - mas que se abriram para algo em nossa frente; o modo como ele fala e para e pisca e ouve e olha e pega na caneta com a mão esquerda e lê uma carta com ideias que tomaram formas e se tornaram palavras bonitas; eu, parando para respirar; um dia inteiro; comprar tecidos como quem compra possibilidades; olhar para os dedos e ver arte a nascer por meio deles; os desejos; um lugar que estacionei meu carro; lembrar-se com a saudade mais gostosa de todas; olhar para o horizonte e ver poesia; a força do que tem que ser; tornar-se o que se deveria ter sido; ir onde se foi; um lugar na mesa; sorrir genuinamente; deixar ir; respeitar meus sentimentos; abrir a boca e começar a falar canção da década de 70; o sol de inverno que, felizmente, se esconde atrás das nuvens e deixa meus dias mais bonitos; poder andar pelas ruas durante o inverno gélido que me esquenta a alma; o desafio de seguir.
30 de mai. de 2016
Se acaso você chegasse
Se acaso você chegasse, seria como se fosse o cair do dia para o começo de uma vida. Quando nos aventurávamos.
Seria a hora de parar o mundo e de experimentar tudo em sua pureza: penso que deva ser como uma ingestão de heroína.
E sempre seria sexta de tarde, ou domingo de manhã, ou sábado o dia inteiro. É também como a véspera do dia pelo qual tanto esperamos.
Se acaso você chegasse, eu me revelaria. Você veria meus olhos e a descoberta do mundo. Leria os meus cadernos e entenderia o significado das poesias.
Se acaso você chegasse, todo o céu do mundo inteiro ficaria azul celeste. De longe, numa nuvem qualquer, sairia um raio único de sol, da cor do seu cabelo. E eu me atentaria para o desenho das suas mãos, porque elas me são tão queridas e seguram a cor do mundo.
O abraço apertado e longo, e também da cor azul, seria sempre o mesmo, se acaso você chegasse. Meus pés são como se estivessem em meias, meu carro como recém-lavado e sempre com cheiro de automóvel novo, uma ponte sempre como a mais alta porque sobre ela caminha a humanidade, os ponteiros do relógio como insignificantes e todo o mistério
da gramática como algo que me seria revelado - ah, se ao menos você chegasse!
E eu diria "oi" para todo mundo sem ressalvas - até para quem eu não conheço - e atravessaria o viaduto com um sorriso no rosto. Teria paixão por câimbras, cozinharia com ainda mais amor, observaria a porta que se abre e como ela move, e o fim do dia teria cheiro daquilo que a gente mais gosta.
Neste instante, sinto-me toda e abraço o meu corpo, porque isso é como se acaso você chegasse...
Seria a hora de parar o mundo e de experimentar tudo em sua pureza: penso que deva ser como uma ingestão de heroína.
E sempre seria sexta de tarde, ou domingo de manhã, ou sábado o dia inteiro. É também como a véspera do dia pelo qual tanto esperamos.
Se acaso você chegasse, eu me revelaria. Você veria meus olhos e a descoberta do mundo. Leria os meus cadernos e entenderia o significado das poesias.
Se acaso você chegasse, todo o céu do mundo inteiro ficaria azul celeste. De longe, numa nuvem qualquer, sairia um raio único de sol, da cor do seu cabelo. E eu me atentaria para o desenho das suas mãos, porque elas me são tão queridas e seguram a cor do mundo.
O abraço apertado e longo, e também da cor azul, seria sempre o mesmo, se acaso você chegasse. Meus pés são como se estivessem em meias, meu carro como recém-lavado e sempre com cheiro de automóvel novo, uma ponte sempre como a mais alta porque sobre ela caminha a humanidade, os ponteiros do relógio como insignificantes e todo o mistério
da gramática como algo que me seria revelado - ah, se ao menos você chegasse!
E eu diria "oi" para todo mundo sem ressalvas - até para quem eu não conheço - e atravessaria o viaduto com um sorriso no rosto. Teria paixão por câimbras, cozinharia com ainda mais amor, observaria a porta que se abre e como ela move, e o fim do dia teria cheiro daquilo que a gente mais gosta.
Neste instante, sinto-me toda e abraço o meu corpo, porque isso é como se acaso você chegasse...
14 de mai. de 2016
A river runs through it
It's me, in the corner, and a river runs through me.
You wouldn't say it - you wouldn't notice it. Neither remember it. But there it is. It's so small sometimes I forget it.
Small doesn't mean unimportant.
It doesn't matter if it's morning, afternoon, evening or late at night. It can be any time, like a glimse to remind myself: a river runs through my heart. And it has got a name. I call it once in a while. It lives within the best part of me. Can you hear me? I'm saying your name.
And as I wake up to a new day, life takes its course - and a river - oh, river, I love the green shades of your water - runs through it. In every detail I am reminded of its power, yet it's so soft. Look at my tender heart and you'll see it.
So you, river, have taken your course, and I've taken mine, because not choosing is also a choice, and thus the seconds of the hours are counted. Once I counted to ten, and I can tell you: I've lost time.
Eventually, all things merge into one, and a River runs through me.
You wouldn't say it - you wouldn't notice it. Neither remember it. But there it is. It's so small sometimes I forget it.
Small doesn't mean unimportant.
It doesn't matter if it's morning, afternoon, evening or late at night. It can be any time, like a glimse to remind myself: a river runs through my heart. And it has got a name. I call it once in a while. It lives within the best part of me. Can you hear me? I'm saying your name.
And as I wake up to a new day, life takes its course - and a river - oh, river, I love the green shades of your water - runs through it. In every detail I am reminded of its power, yet it's so soft. Look at my tender heart and you'll see it.
So you, river, have taken your course, and I've taken mine, because not choosing is also a choice, and thus the seconds of the hours are counted. Once I counted to ten, and I can tell you: I've lost time.
Eventually, all things merge into one, and a River runs through me.
13 de mai. de 2016
Hello, I must be going
Hello, I must be going, porque está tudo perdoado. Tudo perdoado novamente.
Era uma vez um homem grande, que era também um grande homem, mas não era nada. Aliás, era nada e era tudo, e era o mundo. Então, ele chegou com o caderno da vida e me mostrou as anotações.
Olhei e vi.
Depois que li, ele falou e disse assim: está tudo perdoado. E eu, com um sorriso no rosto e a expressão de gratidão no canto dos olhos, respondi que "hello, I must be going, então".
E assim fui.
Fui para onde há árvores verde escuro, onde meu cabelo está solto na brisa do ar e batem nas minhas costas, onde ando pelo caminho da vida, onde meus ombros estai leves. De vez em quando, eu nem mais sinto vontade de escrever, porque é assim quanto está tudo perdoado. A gente perdoa até a gente.
E, indo, I must be going. Posso respirar tranquila. Olhar e ver o que a gente vê. Sentir-me como sou mesma, e dar toda permissão.
Hello, I must be going, porque sempre fazemos o melhor que podemos. E, claro, com esta menina aqui que sou eu não seria diferente, pois sempre estou fazendo alguma coisa até quando não estou fazendo nada, e sempre tenho que fazer o melhor que consigo fazer. E sei fazer tão bem! E, então, fiz! E o que fazemos está feito, basta aceitar ou não. Ouvir o som do coração. Dizer que sim ou virar as costas e seguir os passos. E está tudo perdoado - eu perdoo a mim e a você.
Hello, I must be going - mas, lembre-se: eu fiz o melhor que pude, e, o que eu faço, faço tão bem!
Era uma vez um homem grande, que era também um grande homem, mas não era nada. Aliás, era nada e era tudo, e era o mundo. Então, ele chegou com o caderno da vida e me mostrou as anotações.
Olhei e vi.
Depois que li, ele falou e disse assim: está tudo perdoado. E eu, com um sorriso no rosto e a expressão de gratidão no canto dos olhos, respondi que "hello, I must be going, então".
E assim fui.
Fui para onde há árvores verde escuro, onde meu cabelo está solto na brisa do ar e batem nas minhas costas, onde ando pelo caminho da vida, onde meus ombros estai leves. De vez em quando, eu nem mais sinto vontade de escrever, porque é assim quanto está tudo perdoado. A gente perdoa até a gente.
E, indo, I must be going. Posso respirar tranquila. Olhar e ver o que a gente vê. Sentir-me como sou mesma, e dar toda permissão.
Hello, I must be going, porque sempre fazemos o melhor que podemos. E, claro, com esta menina aqui que sou eu não seria diferente, pois sempre estou fazendo alguma coisa até quando não estou fazendo nada, e sempre tenho que fazer o melhor que consigo fazer. E sei fazer tão bem! E, então, fiz! E o que fazemos está feito, basta aceitar ou não. Ouvir o som do coração. Dizer que sim ou virar as costas e seguir os passos. E está tudo perdoado - eu perdoo a mim e a você.
Hello, I must be going - mas, lembre-se: eu fiz o melhor que pude, e, o que eu faço, faço tão bem!
2 de mai. de 2016
Sem o medo há o mundo
Sem o medo há o mundo e tudo o que a gente quer ser.
Dá até pra saber quando não se sabe nada.
O medo que habita em nós devora a alma e faz tudo parecer de outra cor, e não da cor do que é mesmo. Parece frio no verão, assim do nada, quando estávamos desprevenidos. Uma pressão que nasce de dentro pra fora e irradia como raios de sol amarelo. Lembre-se que o verão seca tudo.
É como atravessar uma rua com o carro já em cima, cair quando criança e machucar o joelho. É aquela comida que desceu engasgada e virou azia. É um lote abandonado que ocupa um grande espaço de uma rua florida.
Sem o medo há o mundo e o que somos mesmo. Parece até poesia.
O frio na espinha, os olhos encharcados mas tão secos, olhar da janela por uma fresta, acordar de manhã e nunca ser sábado, não terminar os livros, andar segurando os braços, escrever sem saber como dizer o que deve ser dito, fixar os olhos em um local no infinito em que nunca se chega e que demora a passar: isso tudo é o medo.
O medo deita por cima da gente, deixa mudo o que dizia, abre os olhos do que não vê, estica uma espinha que era curva. Um dia entende-se um pouco do mundo e no outro sabe-se nada. Perde-se quem a gente foi. Habita uma caixa que fica no cantinho. Vira tudo de ponta a cabeça.
Mas, diz-se, que sem o medo há o mundo e os que habitam nele. Porque muitos só moram. Mas há os outros que habitam porque vivem. Há o céu e há o mundo.
Um mundo inteiro, sem o medo que há no mundo.
Dá até pra saber quando não se sabe nada.
O medo que habita em nós devora a alma e faz tudo parecer de outra cor, e não da cor do que é mesmo. Parece frio no verão, assim do nada, quando estávamos desprevenidos. Uma pressão que nasce de dentro pra fora e irradia como raios de sol amarelo. Lembre-se que o verão seca tudo.
É como atravessar uma rua com o carro já em cima, cair quando criança e machucar o joelho. É aquela comida que desceu engasgada e virou azia. É um lote abandonado que ocupa um grande espaço de uma rua florida.
Sem o medo há o mundo e o que somos mesmo. Parece até poesia.
O frio na espinha, os olhos encharcados mas tão secos, olhar da janela por uma fresta, acordar de manhã e nunca ser sábado, não terminar os livros, andar segurando os braços, escrever sem saber como dizer o que deve ser dito, fixar os olhos em um local no infinito em que nunca se chega e que demora a passar: isso tudo é o medo.
O medo deita por cima da gente, deixa mudo o que dizia, abre os olhos do que não vê, estica uma espinha que era curva. Um dia entende-se um pouco do mundo e no outro sabe-se nada. Perde-se quem a gente foi. Habita uma caixa que fica no cantinho. Vira tudo de ponta a cabeça.
Mas, diz-se, que sem o medo há o mundo e os que habitam nele. Porque muitos só moram. Mas há os outros que habitam porque vivem. Há o céu e há o mundo.
Um mundo inteiro, sem o medo que há no mundo.
12 de abr. de 2016
É de manhã
É de manhã e parece sábado de dia.
Enquanto dirijo pelas ruas, noto como todas as folhas de uma árvore estão em seus devidos lugares. Pingo um ponto na letra "i", sigo em frente, noto tons de verde e penso que poderia ser outono.
É de manhã e estou contigo. É de manhã e desfaço os nós do meu cabelo que nunca existiram. Fecho as cortinas, ou então as abro - tanto faz. Tiro o cisco dos meus olhos, pisco então como se estivesse tomada por uma paixonite aguda e, no fim da rua, vejo que os tons do fim do dia são rosa e laranjado. Parece tão quente e está só acabando o verão.
Quando é de manhã eu faço meu caminho pela praça. Eu avisto o acenar de uma mão. Eu dou significados para os meus entendimentos. Eu fecho a porta e subo a escada correndo, porque nem quero olhar para trás. Eu vejo a cidade de noite e de longe. Eu crio um caderno de recortes que um dia contarão uma história vivida.
É de manhã e por isso estou com fome. Tudo está em seu devido lugar. As coisas são elas mesmas e as cores são do jeito que os nossos olhos as verem. Está tudo tão intuitivo e sei que é isso porque é de manhã. E eu, desse jeito meu, vou sendo eu mesma até o fundo do meu coração porque é de manhã e o relógio parece passar vagarosamente. Eu vi aquela janela sendo fechada, eu desenhei então o parapeito de um prédio, eu corri e abri a porta novamente.
E assim, no instante em que é de manhã, o mundo todo se alinha ao seu contorno e tudo gira ao seu redor. O começo é o mesmo do fim e o pálido é apenas ausência da cor. O que os olhos viram é porque foi vivido e o que os braços não conseguem segurar mora no coração.
É de manhã e estou vivo. Sigamos contentes.
Enquanto dirijo pelas ruas, noto como todas as folhas de uma árvore estão em seus devidos lugares. Pingo um ponto na letra "i", sigo em frente, noto tons de verde e penso que poderia ser outono.
É de manhã e estou contigo. É de manhã e desfaço os nós do meu cabelo que nunca existiram. Fecho as cortinas, ou então as abro - tanto faz. Tiro o cisco dos meus olhos, pisco então como se estivesse tomada por uma paixonite aguda e, no fim da rua, vejo que os tons do fim do dia são rosa e laranjado. Parece tão quente e está só acabando o verão.
Quando é de manhã eu faço meu caminho pela praça. Eu avisto o acenar de uma mão. Eu dou significados para os meus entendimentos. Eu fecho a porta e subo a escada correndo, porque nem quero olhar para trás. Eu vejo a cidade de noite e de longe. Eu crio um caderno de recortes que um dia contarão uma história vivida.
É de manhã e por isso estou com fome. Tudo está em seu devido lugar. As coisas são elas mesmas e as cores são do jeito que os nossos olhos as verem. Está tudo tão intuitivo e sei que é isso porque é de manhã. E eu, desse jeito meu, vou sendo eu mesma até o fundo do meu coração porque é de manhã e o relógio parece passar vagarosamente. Eu vi aquela janela sendo fechada, eu desenhei então o parapeito de um prédio, eu corri e abri a porta novamente.
E assim, no instante em que é de manhã, o mundo todo se alinha ao seu contorno e tudo gira ao seu redor. O começo é o mesmo do fim e o pálido é apenas ausência da cor. O que os olhos viram é porque foi vivido e o que os braços não conseguem segurar mora no coração.
É de manhã e estou vivo. Sigamos contentes.
3 de abr. de 2016
Só por hoje e para sempre
Só por hoje e para sempre o meu céu será sempre azul. E o vento que vem do sul acertará sempre o meu rosto como uma brisa que me abraça. E me lembrará dos lugares vividos e de toda vida que ainda há. E eu anotarei memórias, ideias e lembranças como um combustível anterior.
Só por hoje e para sempre eu serei eu mesma. E estarei sempre olhando para as coisas com meus próprios olhos, que são cheio do meu eu interior, por onde me revelo ao mundo. Eu me entrego sem querer, e só me dou para quem me recebe. E o sorriso que levo no canto da boca orienta meus pés e me dá as mãos.
Só por hoje e para sempre honrarei meus desejos, irei manter-me fiel ao meu sinal de dia-tarde-e-noite. E as chamas acesas. E meu lápis de cor que me decoram a alma. A janela alta e antiga de onde vejo o mundo. O entardecer que vem apenas quando tenho sono.
Só por hoje e para sempre manterei o carinho, pois sou toda feita de amor. Para quem me foi especial pelo caminho, eu sou apenas ternura, e assim sempre será. As lembranças gostosas são como um jardim e para sempre ficarão por lá, seja onde for. E terei sempre meus braços estendidos, o sorriso mais sincero, o brilho mais brilhante nos olhos quando olho para a direção de você - ainda que eu não saiba onde ou aonde - e o que eu mais puder oferecer de bom em cada pedacinho de mundo. Porque assim o sou.
Só por hoje e para sempre serei grata pelo fim de tarde frio, pela arquitetura do bairro, por poder enroscar um pé no outro, imaginar um banquete de hambúrgueres, uma sobremesa que não afetará o meu colesterol, um passeio de carro pela cidade vazia e tudo como deveria ser mesmo. Ah!
Só por hoje e para sempre tudo estará em seu lugar, e as pessoas que um dia existiram e significaram sempre serão e o por do sol terá a cor do meu cabelo. Só por hoje e para sempre.
Só por hoje e para sempre eu serei eu mesma. E estarei sempre olhando para as coisas com meus próprios olhos, que são cheio do meu eu interior, por onde me revelo ao mundo. Eu me entrego sem querer, e só me dou para quem me recebe. E o sorriso que levo no canto da boca orienta meus pés e me dá as mãos.
Só por hoje e para sempre honrarei meus desejos, irei manter-me fiel ao meu sinal de dia-tarde-e-noite. E as chamas acesas. E meu lápis de cor que me decoram a alma. A janela alta e antiga de onde vejo o mundo. O entardecer que vem apenas quando tenho sono.
Só por hoje e para sempre manterei o carinho, pois sou toda feita de amor. Para quem me foi especial pelo caminho, eu sou apenas ternura, e assim sempre será. As lembranças gostosas são como um jardim e para sempre ficarão por lá, seja onde for. E terei sempre meus braços estendidos, o sorriso mais sincero, o brilho mais brilhante nos olhos quando olho para a direção de você - ainda que eu não saiba onde ou aonde - e o que eu mais puder oferecer de bom em cada pedacinho de mundo. Porque assim o sou.
Só por hoje e para sempre serei grata pelo fim de tarde frio, pela arquitetura do bairro, por poder enroscar um pé no outro, imaginar um banquete de hambúrgueres, uma sobremesa que não afetará o meu colesterol, um passeio de carro pela cidade vazia e tudo como deveria ser mesmo. Ah!
Só por hoje e para sempre tudo estará em seu lugar, e as pessoas que um dia existiram e significaram sempre serão e o por do sol terá a cor do meu cabelo. Só por hoje e para sempre.
30 de mar. de 2016
O som do coração
Me diz: se o coração falasse, o que ele iria dizer?
Se meu coração falasse, ele teria cheiro de quando sai do banho. Que é cheiro nenhum, mas cheiro da gente. Teria o tamanho de um prédio grandioso em desenho na folha, mas pequeno em altura porque tenho medo. Mudaria de cor, porque tudo depende de como estará o tempo quando as estações do ano, tão raras, se aproximassem. E eu o levaria apertado nas mãos.
O som do coração já foi tão estridente, o som do coração parece um sussurro perto de um mar. Assim, tão longe. Este ruído baixinho é tao presente que toma conta de um pensamento. Dá até para sentir. Me diz uma outra coisa: a gente sente é com o coração?
Se o som do coração falasse, ele sairia da minha boca em forma de letras. E elas seriam escritas caprichosamente no valor do tempo. Todo o detalhe de uma imensidão seria colocado em cada extremidade e, no fim, ninguém entenderia nada porque precisa-se apenas de ver. Ver. Ver é sentir com os olhos, não é?
Se o som do meu coração gritasse, o eco seria longe, para cima, para o norte, mais ao sul. Ficaria mudo. Ele nunca poderia escolher entre leste ou oeste, porque está sempre na metade. Olha, lá vem o soco no estômago. Machuca, então segura firme porque o dia já vem.
Se o som do coração dissesse qualquer coisa eu o proibiria de dizer porque ele entregaria quem sou eu. Por isso, estamos sempre atentos. Olha só os meus olhos - já viu?
Eu acho que o coração da gente quer sempre falar o que quer que a gente seja. E este frase tem duplo sentido. O mundo nunca teve um significado só. E eu vivo em uma língua estrangeira. E sou eu mesma neste momento, mas eu corri há pouco de mim mesma. Isso soa tão repetitivo mas são apenas as palavras, já que estou em falta delas.
Olho nos olhos, mas vejo o meu coração.
Se meu coração falasse, ele teria cheiro de quando sai do banho. Que é cheiro nenhum, mas cheiro da gente. Teria o tamanho de um prédio grandioso em desenho na folha, mas pequeno em altura porque tenho medo. Mudaria de cor, porque tudo depende de como estará o tempo quando as estações do ano, tão raras, se aproximassem. E eu o levaria apertado nas mãos.
O som do coração já foi tão estridente, o som do coração parece um sussurro perto de um mar. Assim, tão longe. Este ruído baixinho é tao presente que toma conta de um pensamento. Dá até para sentir. Me diz uma outra coisa: a gente sente é com o coração?
Se o som do coração falasse, ele sairia da minha boca em forma de letras. E elas seriam escritas caprichosamente no valor do tempo. Todo o detalhe de uma imensidão seria colocado em cada extremidade e, no fim, ninguém entenderia nada porque precisa-se apenas de ver. Ver. Ver é sentir com os olhos, não é?
Se o som do meu coração gritasse, o eco seria longe, para cima, para o norte, mais ao sul. Ficaria mudo. Ele nunca poderia escolher entre leste ou oeste, porque está sempre na metade. Olha, lá vem o soco no estômago. Machuca, então segura firme porque o dia já vem.
Se o som do coração dissesse qualquer coisa eu o proibiria de dizer porque ele entregaria quem sou eu. Por isso, estamos sempre atentos. Olha só os meus olhos - já viu?
Eu acho que o coração da gente quer sempre falar o que quer que a gente seja. E este frase tem duplo sentido. O mundo nunca teve um significado só. E eu vivo em uma língua estrangeira. E sou eu mesma neste momento, mas eu corri há pouco de mim mesma. Isso soa tão repetitivo mas são apenas as palavras, já que estou em falta delas.
Olho nos olhos, mas vejo o meu coração.
28 de mar. de 2016
O sol também se levanta
O sol também se levanta - quando eu abro a janela.
E, isso, porque é assim. E porque é ela, esta menina, que sou eu. E, aquilo, porque me sou. E, quando sinto, já me fui. E, se estou sentido, olho para o lado rapidamente. Quero desviar minha atenção. Quero só ser sem ser. Quero desenhar em uma folha de papel tudo borrado.
E então o sol se levanta!, e venho caminhando pela rua. E troco o abraço, deixo que vejam meus olhos, não me escondo apenas para mim, sendo-me todinha, e ainda abro o meu sorriso. Pois o sol também se levanta quando o céu está azul escuro e parece que vai chover - ah, sim, isto é quando o sol mais se levanta, posso contar nos dedos!
Uma vez eu escrevi em um caderno e o guardei bem guardado que até o perdi. Mas tudo o que foi escrito é.
O sol também se levanta quando ando com meus pés tão leves. Quando observo minhas pequenas mãos. Quando me permito falar sem dizer nada. Quando só respiro sem sentir o cheiro.
E todas as portas se batem, mas é tudo tão raso que destoa e parece que vai apagar mas fica marcado. Deixa-se ir. Volta a ser quem se é. Perde-se um dia inteiro em um livro. Agradece aos pés. Cria uma coragem absurdamente brava e repica o cabelo de modo que ele fica sob os ombros. E dá de ombros, e então deixa para lá.
Sabe, outra vez eu peguei um espelho e vi tudo o que é. Não era o que estava, não era o que seria e não era o que foi. Era apenas o que se é. Eu senti um sentimento tão profundo e grande que ele parecia pesado, como um oceano muito azul escuro, e então eu notei que quando o sol se levanta o mundo é todo azul e que eu escrevo muito esta palavra porque ela é o que sou. E, assim, perdida nas palavras e folhas e letras e palavras de novo vou me sendo e sou-me e sou eu.
Afinal, o sol também se levanta!
E, isso, porque é assim. E porque é ela, esta menina, que sou eu. E, aquilo, porque me sou. E, quando sinto, já me fui. E, se estou sentido, olho para o lado rapidamente. Quero desviar minha atenção. Quero só ser sem ser. Quero desenhar em uma folha de papel tudo borrado.
E então o sol se levanta!, e venho caminhando pela rua. E troco o abraço, deixo que vejam meus olhos, não me escondo apenas para mim, sendo-me todinha, e ainda abro o meu sorriso. Pois o sol também se levanta quando o céu está azul escuro e parece que vai chover - ah, sim, isto é quando o sol mais se levanta, posso contar nos dedos!
Uma vez eu escrevi em um caderno e o guardei bem guardado que até o perdi. Mas tudo o que foi escrito é.
O sol também se levanta quando ando com meus pés tão leves. Quando observo minhas pequenas mãos. Quando me permito falar sem dizer nada. Quando só respiro sem sentir o cheiro.
E todas as portas se batem, mas é tudo tão raso que destoa e parece que vai apagar mas fica marcado. Deixa-se ir. Volta a ser quem se é. Perde-se um dia inteiro em um livro. Agradece aos pés. Cria uma coragem absurdamente brava e repica o cabelo de modo que ele fica sob os ombros. E dá de ombros, e então deixa para lá.
Sabe, outra vez eu peguei um espelho e vi tudo o que é. Não era o que estava, não era o que seria e não era o que foi. Era apenas o que se é. Eu senti um sentimento tão profundo e grande que ele parecia pesado, como um oceano muito azul escuro, e então eu notei que quando o sol se levanta o mundo é todo azul e que eu escrevo muito esta palavra porque ela é o que sou. E, assim, perdida nas palavras e folhas e letras e palavras de novo vou me sendo e sou-me e sou eu.
Afinal, o sol também se levanta!
29 de fev. de 2016
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