17 de jul. de 2016

Em algum lugar estás a esta hora

Acordo com o dia, abro o olho e logo penso: onde será que ele está agora?

No meio da manhã, não penso em nada, porque a manhã é comum a todo mundo: as pessoas fazem a mesma coisa.

Mas, no fim do dia, quando a noite começa a dar o ar da graça, lembro comigo: em algum lugar ele está.

Eu hoje acordei cedo e esperei a hora passar deitada na cama. Levantei e me vesti toda de mim para ir num lugar perto da minha casa escrever crônicas. Eu olhei o relógio e ainda assim errei a hora. E então, ao chegar quando tinha acabado e não poder fazer nada, pensei: o que será que ele faz agora?

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Eu entrei no meu carro, muito querido, que me leva em todo lugar. Eu observo as árvores pelo caminho e sinto uma gratidão tão grande quando vejo o bairro todo enfeitado de ipês no inverno do meu mês: era só distração de um pensamento - você. Você: em que lugar estás a esta hora?

Eu hoje andei por muitos caminhos. Subi uma ladeira estreita que um dia eu olhei de longe e com medo e pensei: ali, só subo a pé. Mas no outro dia eu subi de segunda marcha e, hoje, subi de terceira a conversar. Eu hoje estava distraída, e corajosa, e cheia de perdão a mim mesma. Eu andava esperando vendo-o passar - ah, se pelo menos ele estivesse aqui!

E ainda hoje eu andei novamente pelo bairro, depois saí da minha casa e fui viver. Mais tarde, cruzei a cidade e passei perto daquele lugar em que meu amigo um dia ficou: toda vez que passo ali lembro de quando todos eles vieram da França. E você, em que lugar estaria a esta hora em que lembro dele e não de você?

E, por último: vejo um vaso de flor na varanda de um prédio, a rua parece lugar nenhum, entro e saio do cinema, passo em duas livrarias só para não perder o costume, compro um presente para a minha irmã porque meu coração é feito ternura, sinto o cheiro do que é distante, não vejo rostos na multidão, fico com vontade de comer um hambúrguer (todos os dias tenho esta vontade), levo um caderno comigo por precaução, noto as cores do céu, converso com um milhão de gente e ainda me sinto sozinha, vejo imagens de balão que andam aparecendo para mim no Pinterest, experimento um pouco da minha indecisão cotidiana, prendo o cabelo num coque bagunçado, coloco brincos vermelhos e noto que é a segunda vez nesta semana que uso vermelho e isso nunca acontece, leio uns poemas do Ferreira Gular na fila só para fazer umas anotações que mais tarde serão usadas, pergunto o preço de um livro e digo como não gosto de perguntar preço de livro, prometo passar na rua coberta de flores ao voltar para casa mas então já é noite e escuridão, observo como as ruas estão vazias e sinto um leve palpitar no peito, meu pensamento me escapa e vai até você, tomo sorvete e penso que mais tarde tomarei de novo e como isso acontecia mais vezes antigamente, fico de novo indecisa, digo a mim mesma "como os filmes poloneses são bons", me imagino falando uma coisa que li um dia, volto para casa e olho para o Andreas e lembro "nós dois uma vez na viagem pela Polônia" e sorrio e vejo na foto que ele sorri também, ... e agora fiquei com preguiça de escrever o que mais aconteceu no dia, que, das 24 horas, tem você em algum lugar a esta hora.

A esta hora... esta e aquela. E as horas do tempo todo.

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