28 de nov. de 2016

O apanhador no campo de centeio

Era uma vez um apanhador no campo de centeio, em meio a outros apanhadores, quando o campo é o mundo. E essa noite era dele, como também o foram todas as outras.

Ele agora começava a atinar.

Uma vez olhou para a lua e pensou que a luz houvera ofuscado seus olhos.

Passados alguns anos, com muita vida em cada, o campo de centeio floresceu. Era a hora de apanhar a colheita.

Era uma vez um apanhador no campo de centeio esta noite. E também todas as outras: era o seu destino.

Um dia eu acordei e vi que não era de dia: já era noite e o começo da vida se abria para mim. E eu me senti como uma apanhadora no campo de centeio.

E então pensei que apanhadores no campo de centeio escrevem um e-mail com dúvida, vasculham a vida com lupa, dormem sem acordar - ou seria o contrário?

E, então, o apanhador estava pronto, pensara eu. É que quando estamos prontos aparece, diria um meu outro pensamento. E marchei-me para o campo que seria meu porque sempre houvera sido.

Sou uma apanhadora no campo de centeio: planto mudas para a vida. Eu ontem escrevi uma coisa num papel e, passados uns dias (o que seria hoje), ele desabrochou. Eu olhei e li. E, quando a gente  e uma coisa que foi falada para a gente, a gente se pergunta quem foi que escreveu.

Isso, porque eu já havia lido: sábado à noite havia ouvido, anotei e hoje tornei a ver - só que escrito. Eu fico pensando: quem é que me escreveu?!

Eu, como apanhadora no campo de centeio, tenho minha vida toda para semear. É preciso começar cedo para vir logo a colheita, mas sei que meu tempo não passa de uma contagem nos relógios que enfeitam vitrines. Há mais para se ouvir e ver, enquanto a colheita fica pronta num portal do lado oposto que é, afinal, ao lado da gente. O tempo, enquanto isso, passa, mas acho que vai todo para o meu bolso.

Sei que neste momento já não estou mais falando coisa com coisa, e nem escrevendo eu poderia estar, então pego as semeaduras e guardo na bolsa e tomo o caminho que escolhi traçar. Como uma apanhadora no campo de centeio.

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