Onde estivestes de noite? - me perguntaram e eu respondi que estive aí.
Estive aí não apenas essa noite, mas ontem, que também foi outra noite. E estivera eu aí também muitas outras noites. E, antes, estivera eu de dia, de tarde, de noite, de madrugada, de manhã - e já era dia novamente.
Desde que vim embora, visito-a à noite: é sempre assim quando fecho os olhos. A gente não escolhe para onde vai quando para de pensar, porque, quando não pensamos, age o coração.
Muitas noites em meus sonhos estive aí, e na manhã seguinte dava-me conta de que, na verdade, eu estava aqui. Fechei os olhos de saudade e fui estar no lugar onde estou.
Muitas noites estive aí e, por isso, vivi. Vivo com você dentro do peito, e vou vivendo enquanto te levo comigo.
Onde estivestes de noite? - se me perguntarem quando eu acordei, vou fechar os olhos de saudade e dizer: ali. Ali é do lado de cá da ponte, porque nunca atravessei. É no bairro de língua parecida com a minha, e de cultura e de comida. Ali é aquele ônibus que vagueia pela cidade e eu nem ligo para o rumo conquanto que o caminho seja os muros da cidade. É a padaria no fim da rua, bem na esquina, que parecia tarde do dia na casa dos meus pais na minha infância. Ali é o lado de cá da cerca, porque não pude entrar na Estação. É o dormitório, e o outro dormitório, e os corredores com cheiro de comida indiana - isso estava fora de lugar. Ali são as ruas abandonadas, e as casas em que atearam fogo, e também os prédios vazios - tudo cheio de história a captar minha atenção. Ali é onde encontrei Sugar Man - o mais doce dos homens a pisar na Terra. Ali é onde explodiram fogos de artifício em meu coração e onde meus olhos pararam de piscar para encarar a Beleza da criação. Ali, logo ali. -- Se me perguntares "onde estivestes de noite?", eu responderei: ali.
Eu ontem acordei sonhando com ela, que é onde eu estive de noite. A você, cidade do fim da linha mas do primeiro lugar no pódio das grandezas, dedico os passos que dou sem sair da cama, quando estou dormindo a sonhar contigo. E a admiração e pequenez que sinto ao olhar a sua grandiosidade: seus prédios, suas vidas, seus habitantes e tudo o que você me permitiu viver.
Parece que estou sendo visitada, mas fui eu que fui visitar você.
Aquela cidade é minha, e é ali que eu estivera de noite.
9 de fev. de 2017
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