Eu não saberia do que teria sido feita se não fosse o cair do dia, aquela hora da aurora, aquele vazio dos dias gelados e o motivo de ser.
Eu era feita do cair do sol, a caminho da noite. Se me visse, notaria as pegadas numa camada espessa branca a cair a madrugada inteira.
Minha pele é feita de aurora e, embora de dia, feita nas primeiras horas da manhã - quando eu ainda nem existia.
Se olhasse mais de perto, veria o brilho no canto. Se houvesse luz do sol, eu ficava transparente. Se fosse noite, eu brilhava. Mas estava sempre tudo ali: sempre tão eu, esse meu jeito de ser.
Minha pele é feita de aurora de uma hora que todo mundo esqueceu: era o meio dia da meia noite, quando todos andavam e cantavam e acendiam as luzes que lhes moram por dentro e corriam para pegar o trem que seguia na vida e mudavam as cores como se tudo fosse apenas folhas de um calendário. Era ali, naquela hora. Onde tudo acontecia e o mundo apenas girava.
Minha pele é feita de aurora e eu estou só adivinhando: a verdade é que não sei que horas são auroras, nem quais horas serão. Tudo que vi foi um escrito no caminhão que andava pela via e, como não gosto de sol, presumi que fosse de noite. É à noite que vem o cair do dia, a hora que a gente se levanta.
Por último, eis minha pele, feita de aurora: se chegares perto e tentares me ler, verás o nome de cada um: pessoas que passaram, mas ficaram. Em mim: naquela pele feita de aurora.
4 de nov. de 2017
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