6 de jul. de 2017

Papai me empresta o carro

(Essa é apenas uma música da Rita Lee)

Papai, me empresta o carro. Me empresta o carro, que a via é perigosa, é contínua e é de dia - se fosse ao menos de noite!

Me empresta o carro, que estou na subida. Me empresta logo, que daqui a pouco vem a descida. Papai, me empresta o carro para as balizas que tenho feito ao longo da vida: sempre entrei nas vagas de baliza de primeira, com muito esmero, parecendo filme - até eu me perguntava: foram minhas mãos a dirigir ou era o meu cérebro a me guiar? Mas estas, de que falo, são apenas as simples balizas de carro...

Papai, me empresta o carro, deixa o tanque cheio de gasolina, ajusta o retrovisor - sim, ajuste o retrovisor para mim. Diga-me quando frear, pega o volante se for preciso! Passa as marchas que eu há muito tempo já sei passar de cor - quero sempre um carro manual, porque carro automático é falta de criatividade!

Papai, me empresta o carro, porque todos queremos guiar e sair logo do banco de carona.

[ Um dia meu pai me deu um carro: era de manhã e ele me levou na loja para ver. A marca é Chevrolet, que é a marca que ele mais gosta. Mas eu fiz do carro algo meu: comprei um adesivo, que é apenas uma letra, a letra D, e que veio de uma longe península que está logo aqui no meu coração, e o enfeitei perto do farol traseiro. Desde então ele traz sempre consigo, e eu sempre comigo, o D, nosso amor comum. E, assim, tomei posse: entrei, dirigi, convivi com ele e o olhei nos olhos - carro tem olho, sabia? Temos convivido quase que diariamente, o meu carro e eu, com exceção dos dias que caminho sozinha, porque eu gosto muito de caminhar pelo mundo enquanto vou vivendo - caminhar é viver a fundo. ]

Voltando ao assunto: papai, me empresta o carro. Me empresta o carro que você tem. Me empresta um carro que passa por uma via do mundo. Me dá as direções. Me escuta te chamar sem falar teu nome. Me empresta e eu te devolvo o que é teu. Pego para mim só o que é meu, só o que sou eu - por isso, papai: me empresta o carro?

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