O céu que nos protege parece uma mão que vem carregar a gente.
Faz dia e faz sol, faz noite e está nublado. Pensei até na palavra lisonjeiras agora, como se eu a tivesse inventado, pois não sei o que significa.
Ela é feita de ossos, ela tem sorriso de maçã. Ela aperta os olhos tão fechadinhos e coloca um leve sorriso no rosto como se fosse um papel de parede nos anos 50. Ela caminha a passos curtos e apressados para a aula em que se aprende; ela deixa o prédio e não sabe para onde foi. Ela faz a leitura de um livro para espantar os minutos das horas.
O céu que nos protege tem gosto do cheiro da lembrança que a gente mais gostou. Parece algo tão complicado, porque é muito simples para nosso entendimento. Uma vez eu prestei atenção em um passarinho, e isso eu quase não faço pois não tenho tempo. Eu penso que há tantos passarinhos que eles se tornaram coisa comum. Mas, um dia, eu prestei atenção em um passarinho e corri e escrevi uma coisa passageira para que ela permanecesse.
O céu que nos protege tem a cor de um lenço de cabelo. Eu diria azul escuro de bolinhas, mas eu nem sei que cor é esta, mas sei que ela está ali. A gente fala as coisas como se tivesse cantando a nossa música preferida. Sabe como? Assim: a gente canta, fala e repete; a gente sabe de cor. Toca no fundo da nossa mente, sem parar. Fica ali. Faz morada. Vive com a gente. Algumas vezes cantamos mais, outras menos. Algumas vezes nem cantamos, mas a música está ali pois ela vive com a gente dentro de um lugar nosso que ela escolheu habitar. Será que dá para escutar daí?
E, não importa o passo que a gente dá, uma nuvem que parece uma morada sempre acompanha a gente nos olhando de rabo de olho como a espiar para não atrapalhar nossos próprios movimentos: é o céu que nos protege.
Um dia em soprei algo que eu disse em seu ouvido, deixei o céu pegar a minha mão mas sem mudar quem sou. Deixa eu ser eu mesma, a pessoa que nasci. Pois todo mundo é cada um, e tudo parece tão turvo agora. Na verdade, esta não era a palavra que eu queria usar, mas eu estou perdendo muitas palavras ultimamente, e este e um processo que tem durado alguns anos. Por isso, vou cantar aquela música, na verdade eu tenho muitas músicas e, além disso, sou uma menina indecisa, e vou ler uma poesia porque, assim, vou falar eu mesma as coisas que outra pessoa escreveu, e então você verá que outra pessoa também já quis aquilo, e assim haverá muito mais argumento em minha parte. Sei: não estou fazendo sentido algum.
O céu que nos protege, por último, tem o semblante de uma mãe que se abstém de todo o egoísmo. Ele recorda uma avó velhinha cheia de sabedoria, esquecendo a parte limitada e atrasada, é claro. De vez em quando, ele até veste uma roupa, assim, meio como uma camisa social dobrada ate o meio do braço, pois esta é a maneira de se vestir para a vida, e veste também a coragem do tempo, a mansidão dos valores e o instinto de proteger. E, quando ele está quase virando esta pessoa toda por dentro, volta como uma mão a acariciar meu cabelo, pois não se pode perder a terna essência. Sejamos doces.
Neste momento, irei cantar todas as minhas músicas que sei de cor (mentira, não sei nenhuma. Eu só sei cantar pedaço de uma, pedaço de outra) e vou ficar repetindo as partes que gravei como se eu fosse um disco arranhado, e lhe entregarei nas mãos, com a preposição que eu bem desejar, quem sou.
E, enquanto o tempo passa, vamos seguindo - sob o céu que nos protege.
13 de out. de 2015
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