7 de jan. de 2015

O medo devora a alma - ou "Angst Essen Seele Auf"

O medo devora a alma, "Angst Essen Seele Auf" - assim, desse jeito.

O medo devora a alma, mas fala-se de "alma" bem baixinho que é para não despertar os tiranos.

A invasão contra os bárbaros salvou o mundo dividindo-o em dois: eles, e nós. E, claro, quem não está em lugar nenhum, como eu. Oh, como somos gratos, nós do mundo inteiro que no futuro seremos apenas história, a vocês, povos civilizados constituintes das causas tão nobres.

Quem são os bárbaros?

A balança do poder moveu-se com o ponteiro do relógio, sacudiu conforme a voz da multidão, cortou o dedo em uma faca. Tampa-se os olhos e os ouvidos. Enquanto isso, leva-se a vida como um dia comum.

O medo devora a alma porque nunca se sabe se serão capazes de fazer o que fizeram no passado. Será que hoje o mundo mudou? Será que hoje as pessoas mudaram? Será que uma geração pode mudar mesmo, assim tão rápido?!? Enquanto isso, o medo devora a alma e vivi-se um dia de cada vez enquanto tenta-se chegar a padaria. Vergonha nacional. Internacional. Do mundo inteiro. Mas virou apenas uma página da historia - será que eles estudam isto - a vergonha - na escola?

O medo devora a alma de um senhor das costas curvadas, roupas em tons bege, e uma sacola na mão. Ele reside ao fim da rua, mas eu diria que é tudo a mesma coisa. Ele é jogado para a esquina, levado cada vez mais para fora, até formar a periferia, que ele chama de casa.

O medo devora a alma porque as pessoas são intolerantes. Porque eu não quero ouvir falar de deus e não pode-se mais usar a caneta. O medo devora a alma porque não há mais câmaras de gás e o trabalho não liberta. Seremos todos comunistas em um bairro divino onde comeremos maçãs sentados em um muro a observar o outro morrer. O outro, não eu. Nunca nós mesmos.

O medo devora a alma e vira filme de cinema. Vira-se estrela de cinema. Vira-se ícone. Ensina-se mas nunca se sabe se foi aprendido.

Prometo que nunca haveria reparado em como o medo devora a alma se não fosse minha inteligente e sensata irmã, que leu e me apontou a ironia - tanta ironia em um título tão simples, sincero e profundo. E, claro, escrito de forma "errada" - "Angst Essen Seele Auf".

Ah, o medo devora tanto a alma! Teme-se a terra branca, escreve-se um título errado mantendo o erro linguístico com carinho, pensa-se, vive-se, trabalha-se e sobrevivendo iremos - aqueles que ficarem e não forem.

5 de jan. de 2015

Que horas são aí?

 Me diz que horas são por meio dos seus olhos. Me diz que assim vou olhar o ponteiro de ponta a cabeça e veremos os mesmos pontos minúsculos de poeira cósmica.

Diga-me que horas são neste local do mundo, assim tão distante de mim mas ao mesmo tempo sempre tão ao meu lado! Quase dentro de mim, fazendo-me quem sou.

Aqui há quatro cantos nas paredes, porque os cômodos tendem a ser quadrados. E o mundo já não é mais uma bola, pois esta ficando quadrado também. E as pessoas, e ate os cheiros das flores perfumosas.

As horas de todos os locais do mundo são a mesma, ainda que em horários diferentes. E assim também será o horário do fim do mundo, das alegrias e tristezas, ainda que este dia nunca chegue e exista apenas em livro.

A gente vai tomando socos da vida, mas nem é da vida não, e vai colecionando dores e um dia se da conta de parar para perguntar que horas são.

Há hora para tudo e a hora há de chegar. E neste momento os verbos do latim tão chatos irão se destacar da folha e serão apagados pelo sopro da memória. E neste momento será o mesmo momento para todo mundo.

E quando as horas passarem depressa porque houve muita felicidade envolvida, em outro local do mundo as horas passam devagar e doloridas, respingando. Tira-se um quadro da parece porque há tempo e leva ternura. Basta saber notar.

Me diz que horas são e me sacode, abra meus olhos que estão quase fechando, respira perto de mim, toma folego e me impulsiona, sussurra os segundos de vida que ainda restam no planeta - o mesmo para todos nos, quem diria - e não esquece de parar o tempo. Porque sim, perde-se tempo, o tempo é perdido.

Que horas são aí para você que, embora tão similar, é-me tão diferente (acho que acabei de inventar esta conjugação verbal, mas tudo vale a pena?). Que horas são os momentos que formam seus dias, e completam os segundos tao curtos e infinitos que, juntos, formam um vida toda com um fim ao final?

Diga-me as horas que eu te direi os momentos. Dá-me a mão neste mundo, eu que navego distante do sol porque prefiro o inverno. E sei que perdi os pontos cardeais de um momento que levou a todas as perdições da história.

Vem-se o vento, mas não antes de eu lhe perguntar: que horas são aí? A mesma que a minha?